Tia Mila

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Sao Joao Do Sul , SC, Brazil
A Tia Mila iniciou em uma garagem de minha casa, mas devidos a circunstâncias pessoais foram interrompidas as atividades, durante dez anos. Mas a vontade de incentivar a leitura é tão grande, que estou retornado as atividades online, até que eu possa novamente levar aos espaços físicos.

20 de abr. de 2009

parte 3





Continuação









Portifolio para se trabalhar com pessoas portadora com deficiencia visual










O pedagogo precisa sempre estar atualizado, não se pode formar e estacionar em uma escola hoje ele precisa muito mais do que pegar na mão do aluno e ajudar ele a escrever, tem se como objetivo formar um cidadão críticos capazes de mudar a sociedade pela qual vivemos, tem que estar sempre aprendendo seja com seu aluno, com seu companheiro de trabalho, com a família ou com o amigo, apesar de que estes pilares da educação servem de base para tudo que se tem hoje, umas das causas pela qual a profissão de pedagogo tem aberto novos caminhos.

9 de fev. de 2009

Os verdadeiros donos da terra

Os verdadeiros donos da terra
Milena BorBa

“Quem me dera, ao menos uma vez, como as mais belas tribos, dos mais belos índios, não ser atacados por ser inocente”.
Quem me dera, ao menos uma vez, fazer com que o mundo saiba que seu nome. Esta em tudo e mesmo assim. Ninguém lhe diz ao menos obrigado “
Legião Urbana

Povos indígenas que viviam nessas terras eram os verdadeiros donos das nossas terras, das matas e dos campos brasileiros.Os indígenas que habitavam aqui em nosso pais viviam a maior parte das pescas, da caça e da agricultura e principalmente da mandioca.
Os indígenas tinham os costumes, de crenças e organizações diferentes entre si, mas são comuns nas maiorias dos grupos. Os índios apreciavam muitas artes. Eles dançavam, cantavam e também homenageava algum tipo de força da natureza.
Cada tribo se subdividia, cada um com os seus chefes. Tinham relações baseadas em regras sociais, políticas e religiosos. Mas todos tinham as mesmas obrigações.
Para os europeus, os índios eram considerados grosseiros. Dessa maneira davam se visão e acreditavam que poderiam mudar a seguir em uma cultura européia.
O homem branco, ao contrario dos índios é o próprio desequilíbrio da natureza. Ele é um predador.A visão que é necessária para nossa sobrevivência foi distorcida, caindo num exagero. Ela é , muitas vezes,um produto da ignorância, do descuido ou tentativas de poupar dinheiro quando se liberta um produto químico para o ambiente.
Os próprios índios ignoravam a propriedade, a moeda, o comercio e viviam totalmente livres, sendo cada um rei de si próprio. Mas isso se transformou após do choque entre essas duas culturas.
Eles acreditavam ser donos dessas terras, já que seus antepassados viveram no Brasil com a floresta toda. Ele não quer ficar só na historia, mas sim querem um lugar onde possam permanecer sua cultura e suas gerações futuras.
Os índios não destroem a natureza, ele participa dela.Mas quem destrói a natureza é o homem branco, por se explorar o mais rápido o possível e da forma menos trabalhosa para chegar ao enriquecimento.
Os índios deixaram de viver quando perderam suas tradições culturais e passaram a sobreviver de acordo com o que a sociedade moderna permite.
A população urbana, que vive distanciada as áreas indígenas, tende a ter deles uma imagem favorável.Os índios são considerados pelo senso comum os donos da terra e seus primeiro habitantes, aqueles que sabem conviver com a natureza sem destruí-la. São também vistos como parte do passado e, portanto, estando em processo de desaparecimento.
Considerando-se que o homem branco tirou o índio a capacidade de viver em equilíbrio com a natureza, forçando a atual situação em que o índio precisa produzir seu sustento, um raciocínio pratica em troca de recursos naturais existentes em reservas.
Para os índios a terra é muito mais que um simples pedaço de chão aonde podemos construir nossos altos prédios; ela é sagrada. Isso porque tudo que eles precisam vem da terra: ela que dá os frutos às folhas, o abrigo e é por causa dela que plantam e dela todos os animais dependem.
Não se respeita o que não se conhece: ou tem,ou se o despreza. Respeito é outra coisa. A temática indígena faz se pensar nas maiorias das vezes da desigualdade que o Brasil tem. Isso vem se refletindo das incongruências da nossa sociedade.

O mito e sua superação

O mito e sua superação
Paulo César Fernandes
Objetivo (O que ?) :
Realizar um estudo do mito, trazendo à baila as suas mais diversas manifestações, visando colocar aos espíritas e à sociedade em geral, a necessidade da ruptura com a mentalidade mítica.
Tal mentalidade mítica, a meu juízo, não se coaduna com a humanidade “no limiar do novo milênio”, como gostava de afirmar Herculano Pires.
Esse trabalho surge, a partir de observações minhas de diversas pessoas, sendo elas das mais diferentes classes sociais, das mais diversas concepções de vida.
Todos carregamos nossos mitos, e, muitas vezes por eles lutamos, nos degladiamos com nossos semelhantes. Somos irascíveis e até violentos ante pessoas e posturas que nos ponham os mitos em cheque, mitos estes carinhosamente acalentados ao longo de anos, décadas e até por toda uma vida.
A proposta é que o trabalho venha a ser um alerta, no sentido de cada um analisar os mitos presentes à sua volta, e, de posse do conhecimento dos mesmos, a eles se contraponha, preparando-se dessa forma para o século, ou o milênio que se avizinha.
Estrutura do trabalho
1) Introdução
Apresentação do tema justificando sua necessidade como proposta espírita, mormente no momento em que a humanidade tende a uma unificação, uma integração mais profunda na área econômica, começando a balançar os mourões de cerca estabelecidos nas fronteiras dos diversos países, dando assim, os primeiros passos no sentido de sua retirada.
No próximo milênio, mitos e fronteiras estarão caindo, pela própria necessidade do estabelecimento de novas relações entre as diversas nações. Caindo inclusive, apesar das fortes dificuldades que encontrará, o mito maior de pátria.
2) O mito e o tempo
Manifestamente parafraseando Herculano Pires em “O espírito e o tempo”, minha proposta para este capítulo é estabelecer uma introdução histórica para a abordagem do mito, buscando com isso provar a ancestralidade do mito como forma de explicação e justificativa de diversos fenômenos apresentados ao homem na sua vida quotidiana.
3) Definição de conceitos : significante, significado, signo, língua, mito.
Neste capítulo estará sendo feita a definição dos conceitos a serem trabalhados nos capítulos posteriores, explicitando a relação existente entre tais conceitos e a temática do trabalho.
4) Manifestações míticas na modernidade
4.1) Mito no discurso marxista
A partir da análise de livros de Fundamentos de Marxismo-Leninismo mostrar diversos momentos onde se mitifica o discurso na produção cultural da antiga União Soviética.
4.2) O mito numa sociedade industrial
4.2.1) Produtos da cultura de massa
A partir das observações feitas por Humberto Eco quando analisa o “Mito do Superman”, extrapolar tal análise para outros produtos da cultura de massa.
4.2.1) Produtos das grandes corporações
Analisar como as grandes corporações trabalham através da propaganda os conceitos de qualidade, atendimento, etc, o que acaba agregando ao produto um conteúdo mítico.
Analisar ainda como o mito se estrutura na esfera do consumo.
4.3) O mito nas concepções religiosas
Identificar os mitos presentes, tanto na Igreja Católica como nas diversas vertentes do pensamento protestante.
5) O mito no espiritismo
Neste capítulo estarão sendo trabalhados tanto os mitos teóricos como as pessoas mitificadas e como essa mitificação impactou o movimento espírita em geral.
6) Propostas para superação
Levantar a necessidade do debate honesto entre os participantes do movimento espírita no sentido de identificar os mitos presentes no dia a dia das diversas casas espíritas.
Discutir ainda os mitos presentes no quotidiano das pessoas.
A identificação dos mitos, seja a nível pessoal como a nível de movimento espírita, é o primeiro passo para o processo de superação. É preciso deixar claro que, a superação total apenas será possível no transcurso do tempo. Isto se for havendo um acúmulo de discussões desnudando os mitos em todas as suas instâncias.
Paulo César Fernandes

MITO: uma realidade.
O mito é o nada que é tudo
O mesmo sol que abre os céus
É um mito brilhante e mudo
Fernando Pessoa
CPDoc
Centro de Pesquisa e Documentação Espírita
1997
Introdução
or que escrever e discutir o mito, essa coisa lá das remotas eras ?
Alguns hão de fazer-me tal pergunta, a estes eu responderei haver um engano nesse aspecto, o mito foi, e ainda é, um forte componente do dia a dia de todos nós.
Claro, o desenvolvimento cultural da humanidade, acabou trazendo e estabelecendo novas formas de mito, como veremos ao tratar do assunto, nos capítulos relativos ao mito na era moderna.
O ponto de união entre os mitos clássicos, digamos assim, e os mitos modernos é justamente sua irracionalidade, em que pese, muitas vezes, todas as explicações objetivando colocar um mito determinado no patamar da racionalidade.
Assim que iniciei a pensar sobre o tema, encontro um texto de um professor da Unicamp na qual ele afirma de maneira categórica da impossibilidade do homem viver sem o mito. Esse “achado” acabou fazendo com que eu deixasse minhas reflexões em “banho Maria”.
Numa das reuniões de trabalho do CPDoc - Centro de Pesquisa e Documentação Espírita, acabei revendo minhas posições e acreditando viável a possibilidade de discutir a necessidade de superação da mentalidade mítica, enraizada em cada um de nós. A isto veio se somar a convocatória da Licesp para envio de temas para o V SBPE - Seminário Brasileiro do Pensamento Espírita. Acabou sendo o mel na sopa.
Minha idéia, inicialmente, é trabalhar historicamente a questão do mito. Tanto na antigüidade como na era moderna, chegando a discutir algo dos mitos das religiões, para depois estabelecer uma análise do mesmo no movimento espírita.
Fazer breve discussão de alguns conceitos como mito, signo, significado e significante, o que deverá ajudar na compreensão da própria conformação do mito.
E, ao final estabelecer uma proposta para sua superação, uma vez que, a mentalidade mítica não se coaduna com uma humanidade “no limiar de uma nova era” como costumava dizer José Herculano Pires.
É possível, que no aprofundamento da minha pesquisa, venha a concluir da impossibilidade de tal superação nos próximos séculos, ou, da impossibilidade total de sua superação. Este é um risco calculado que só me debruçando sobre o tema poderei chegar a alguma conclusão.
Este trabalho, assim, se insere no momento atual, apenas como um promotor de debates, um “cutucador” de consciências.
Logicamente, pessoas ligadas à história da humanidade, em seu aspecto cultural, pessoas ligadas à antropologia cultural mais especificamente, poderão trazer novas contribuições, novos trabalhos contraditando minhas idéias, ou mesmo, elementos que venham fortalecê-las e aclará-las.
Meu mérito, se existe, é trazer ao seio do movimento espírita, um tema que vem se firmando no meio acadêmico, mormente após a derrocada das certezas científicas para dar lugar ao universo das probabilidades, das incertezas.
O autor
Dedicatórias & Agradecimentos
Este trabalho é dedicado ao Professor José Herculano Pires, cuja inteligência brilhante, abriu fendas de racionalidade no seio do Movimento Espírita, indicando a todos nós o caminho de uma nova era.
Conceito
e início, vale a pena estabelecermos uma idéia, um conceito sobre o tema.
Mythos quer dizer palavra. “No princípio era o verbo ...” segundo os relatos bíblicos.
Se formos buscar porém no dicionário, no Aurélio por exemplo, encontraremos :
• mito - fato, passagem dos tempos fabulosos;
• tradição que, sob forma de alegoria, deixa entrever um fato natural histórico ou filosófico;
• coisa inacreditável, sem realidade;
• representação de fatos ou personagens reais exagerados pelo imaginário popular ou pela tradição.
De todas estas conceituações, a que mais se coaduna com meu projeto, pelo menos no presente momento é a última.
Conversando com uma professora em Santo André, quando disse eu estar trabalhando sobre o tema mito, esta se apressou em afirmar :
_ Os dogmas, os mitos são temas interessantes.
Isto me levou a refletir na necessidade de diferenciação entre um dogma e um mito.
Enquanto o dogma, é algo estático, estabelecido por alguém, por alguma entidade em determinado momento, cabendo-nos apenas aceitá-lo ou rejeitá-lo; o mito, por sua vez se caracteriza pela dinâmica, e pela possibilidade que nos dá para sua construção. No mito, somos também partícipes do processo.
Outro aspecto a considerar sobre o mito, é sua temporalidade presente e sua proximidade geográfica, sempre se trata de algo vivido e presente no aqui e no agora.
O mito abrange uma totalidade que a consciência discursiva não consegue apreender, e, recorrendo aos símbolos acaba sintetizando as mais profundas aspirações do ser humano, tais como sua sede de absoluto, de transcendência e sua busca de plenitude.[1]
Campbell nos diz não haver conflito entre o misticismo e a ciência, mas haver distinção entre a ciência de 2000 a C e de 2000 d C, segundo ele “ ... o que nos perturba é o fato de termos um texto sagrado que foi composto em outro lugar, por outro povo, há muito tempo, e que não tem nada a ver com a experiência de nossas vidas. Há, pois, um distanciamento fundamental. Quando voltamos nosso olhar para esse texto, vemos que se trata de um texto que se refere ao homem como algo superior à natureza, que fala do domínio exercido pelo homem sobre a natureza como algo que lhe foi concedido. Tal é a diferença entre a mitologia considerada como algo petrificado, exaurido, morto, não mais atuante, e a mitologia vista como algo atuante. Quando a mitologia está viva, é desnecessário dizer o que ela significa”.[2]
Para o Campbell, o mito estaria ligado à pedagogia do indivíduo, e forneceria a este uma pista que lhe serviria de guia. Até o presente momento pode ter sido realmente assim, mas a proposta é justamente acordarmos para um novo momento onde o mágico e o mítico cedam lugar ao racional, mas um racional que leve em consideração aspectos metafísicos.
Segundo Augusto Novaski “o mito não é ficção, engano ou falsidade; é, isto sim, um modo de falar, ver e sentir dimensões da realidade inatingíveis racionalmente, dando-lhes significado e consistência.”
O autor nos diz ser o mito para os filósofos, um produto deformado da atividade intelectual, uma forma primitiva de pensar, coisa de pessoas de baixa cultura ( p. 26 ). Na sua visão, “o pensamento ou atitudes míticos são um instrumento de controle social. Nessa lógica, a função do mito seria indispensável a toda cultura, ...”
Tal observação é importante de ser analisada também ao nível dos nossos mitos. Se os mitos socialmente disseminados agem como elementos restritivos de uma determinada comunidade ou sociedade, não estariam nossos mitos individuais cerceando nossas possibilidades de ampliar concepções.
O emocional dos nossos mitos não estaria aniquilando a possibilidade de novos horizontes racionais? Possibilidades mais amplas de compreensão das Leis Naturais[3] ?
O mito no tempo
omo os índios dos filmes de bang-bang, estaremos em cima de um desfiladeiro, olhando embaixo a passagem de alguns flashes, alguns momentos do mito na história.
Olhando bem atrás no tempo perceberemos os primitivos, quase macacos, se colocando de pé e deixando livres as mãos para utilizá-las na confecção de instrumentos. Um desses instrumentos, encontrado faz 500000 aC às margens do Rio Tâmisa, foi chamado pelo poeta californiano Robinson Jeffers de “beleza divinamente supérflua”. Em suas seis ou oito polegadas de nada servia praticamente, mas, ao mesmo tempo muito representava na observação histórica da humanidade.
Muito tempo passou até que surgisse sobre a face da terra o Homo Sapiens, e foi com ele o surgimento dos primeiros traços do pensamento mitológico, expresso nos sepultamentos onde foram encontradas oferendas, mais exatamente por volta de 60000 aC no período do Homem de Neanderthal.
Uma outra evidência do pensamento mitológico daquela época era a adoração de crânios de ursos nas cavernas. Vestígios de capelas para esse fim foram encontradas na região alpina da Suiça e da Silésia, nestas os crânios de ursos apareciam adornados de pequenos anéis de pedra.
Convém lembrar que mais tarde, no horizonte cultural primitivo, quando o homem se via ante o desafio de explicar um novo fenômeno, se valia do mito como forma de expressão para dar conta desse novo fenômeno. Dessa maneira o mito acabava dando conta da questão do ordenamento social. Eliminava a instabilidade gerada por algo novo. Temos assim que “a consciência filosófica nasceu da consciência mítica.”[4]
O professor José Herculano Pires em seu livro “O Espírito e o tempo”, quando trata do horizonte agrícola diz serem a China e a Índia os dois países que mantém, a mesma estrutura religiosa até os nossos dias. Segundo ele:
“Aquilo que chamamos de horizonte agrícola, o mundo das grandes civilizações agrárias, constitui uma espécie de subconsciente coletivo das civilizações modernas. Os resíduos mágicos, anímicos e mitológicos do horizonte tribal e do horizonte agrícola apresentam-se bastante fortes no mundo contemporâneo. Nossas religiões mostram-se poderosamente impregnadas desses resíduos”. ( grifo nosso )[5]
Estas pinceladas iniciais são uma breve introdução do que estará compondo este capítulo no futuro, mostrando a presença do mito nos mais diversos momentos da história da humanidade. Pois, segundo os diversos autores consultados para a elaboração do presente trabalho, o mito é algo intrínseco do ser humano, estando este impossibilitado da ruptura com o mesmo. Aí se situa minha divergência dos mesmos e a razão de ser deste trabalho.
Para seguir pensando no tema vale a pena tocarmos em algumas palavras, alguns conceitos que compõe o tema.
Mito, signo, significante, significado
egundo Roland Barthes o mito é uma fala, e tudo pode ser mito, uma vez que seu universo é infinitamente sugestivo. Segundo ele, “é a história que transforma o real em discurso, é ela e só ela que comanda a vida e a morte da linguagem mítica”[6]
É importante tal observação pois nos alerta a perceber que o mito só se constrói no passar do tempo, e no contar e recontar um fato. Segundo a sabedoria popular “quem conta um conto aumenta um ponto” e é nesse aumentar de pontos que os elementos míticos vão se agregando.
Outro aspecto a se considerar, além da construção do mito no tempo, é a necessidade de um patamar mínimo de organização social, de existência de relações interpessoais para a ocorrência do mito.
Segundo Bakhtin “Os signos só podem aparecer em um terreno interindividual. Ainda assim, trata-se de um terreno que não pode ser chamado de “natural” no sentido usual da palavra; não basta colocar face a face dois homo sapiens quaisquer para que os signos se constituam. É fundamental que esses dois indivíduos estejam socialmente organizados, que formem um grupo ( uma unidade social ): só assim um sistema de signos pode constituir-se.”[7]
Em todas as formas de mito a serem analisadas neste trabalho a questão tempo estará sempre presente. Às vezes, para atender seus interesses as empresas buscam, através da propaganda, trazer para mais uma data mais cedo a consolidação de um mito, o que nem sempre conseguem.
Mas esse não é o caso mais comum, em geral não é possível a interferência na construção de um mito, ele simplesmente se dá, dentro da dinâmica própria do processo histórico.
Um mito é composto de diversos signos, e cada signo seria a resultante de um significante e de um significado, onde o significado é o conceito e o significante a imagem acústica ( de ordem psíquica ).
Assim, uma pedra preta por exemplo, é um simples significante, apenas uma idéia, diríamos. Porém, se a este objeto agregarmos uma conjuração de morte, passamos a ter então um signo : resultado do significante pedra preta, mais o significado morte.
E assim, no decorrer do tempo, diversos objetos ganharam significações diversas, como nos fala ainda Bakhtin, “Em si mesmo, um instrumento não possui um sentido preciso, mas apenas uma função : desempenhar este ou aquele papel na produção. E ele desempenha esta função sem refletir ou representar outra coisa. Todavia, um instrumento pode ser convertido em signo ideológico : é o caso, por exemplo, da foice e do martelo como emblema da União Soviética. A foice e o martelo possuem, aqui, um sentido puramente ideológico.”[8]
A Palavra
através das palavras que os mitos se transmitem e garantem sua permanência num determinado período de tempo.
A palavra é um fenômeno ideológico, pois uma palavra, em si mesma é neutra. Porém, na medida em que uma palavra compõe uma frase, o contexto de uma idéia, ela acaba se estabelecendo como um signo ideológico.
Se falarmos casa, por exemplo, temos de imediato a idéia de um edifício com portas e janelas. Se dizemos no entanto “casa da cidadania”, ou “casa da oração”, de imediato emergem outras conotações, conotações ideológicas a compor tais expressões.
A palavra, por ser neutra, pode se adequar a qualquer contexto ideológico, seja ele político, cultural, religioso, etc..., vai daí a sua importância na compreensão dos aspectos ideológicos, estejam eles num jornal, filme ou peça de teatro.
Em todos os lugares encontramos mitos expressos através de palavras ( signos ) compondo um contexto ideológico.
Mitos na sociedade industrial
a nossa sociedade, voltada para o consumo, temos a necessidade de criação de mitos, para que estes possam garantir a manutenção da estrutura de produção/consumo da sociedade.
Se estrutura, a partir daí, uma ideologia de consumo que, atuando a partir das carências emocionais do indivíduo, atribui ao produto uma função e utilidade mais amplas que as originalmente para ele pensadas.
_ Paulo, Unisys, IBM, são todas máquinas, essa sua idéia de achar a IBM melhor não passa de mito.
_ Mas não, a IBM afinal ...
E segui arrolando idéias e justificativas para buscar impor minha concepção no tocante ao tema. Novos assuntos vieram à baila e a roda do café se desfez.
Caminhei para minha mesa “com uma pulga atrás da orelha”. Por que motivo teria eu defendido a empresa, e sem nada receber por isso. No momento em que me desvendaram o mito com relação à antiga empresa fiquei surpreso; na roda, fiz de conta que não havia sido tocado, mas a dúvida, o questionamento se instalou em mim.
Teria eu uma postura mítica com relação a IBM ?
Teriam os quatro anos que atuei como funcionário da empresa contribuído para a construção desse mito ?
Era difícil pensar em tal assunto.
Lembrava meu início de vida profissional, os amigos na empresa, o atendimento que vinha recebendo da IBM na Prefeitura Municipal de Santo André. Essas lembranças tornavam a análise racional impossível, só havia campo para o emocional.
Assim é, toda a análise que se faça do mito. Pura emoção.
Para mim, o signo IBM teve forte conotação emocional, me trouxera “Status” e outras tantas coisas que me foram importantes em determinado momento. Fez parte, na verdade, de um contexto ideológico que trabalhava a vaidade dos funcionários e outras tantas questões as quais visavam obter dos funcionários maior adesão aos projetos da empresa. Ainda hoje, quando um funcionário da IBM apresenta algum ex-funcionário a outro IBMista faz questão de frisar ser a pessoa em questão Ex-IBM.
De uma certa forma tal postura é explicada por Bakhtin :
“Um signo não existe apenas como parte de uma realidade; ele também reflete e refrata uma outra. Ele pode distorcer uma realidade, ser-lhe fiel, ou apreendê-la de um ponto de vista específico, etc. Todo signo está sujeito aos critérios de avalizção ideológica (isto é : se é verdadeiro, falso, correto, justificado, bom, etc.). O domínio do ideológico coincide com o domínio dos signos : são mutuamente correspondentes. Ali onde o signo se encontra, encontra-se também o ideológico. Tudo que é ideológico possui um valor semiótico.”[9]
Assim, dentro da realidade do universo IBM, havia o mito que os funcionários IBM seriam profissionais de maior gabarito que os demais do mercado, uma vez que o critério de seleção era ... e uma série de justificativas que se conformaram num mito. E nesse caso, o mito carregava em si uma série de inverdades, até porque, encontrei em outras empresas profissionais melhores que diversos funcionários da IBM.
Mitificados pelo tema
as diversas leituras feitas por mim para a elaboração do presente trabalho, tive a impressão que os autores, todos eles, eram presas da magia do mito; como uma teia, o mito os reteve e, resignados, passaram a propalar a idéia do mito como algo insuperável, algo assim como a respiração, sustentáculo da vida.
Segundo Constança “a perda do sentido existencial implica, para ser superada, na reconquista da dimensão mítica, no abandono do falso logos do mito, na recusa do mito como verdade imediata a fim de retomá-la, mediante o reconhecimento do poder de revelação dos símbolos”.
Admito ser um tema envolvente, forte, capaz de nos arrebatar à medida que lhe desvendemos as raízes, principalmente se nos atemos aos mitos dos povos primitivos.
São, porém, construções e explicações primitivas da realidade, já sem contraponto no horizonte atual, e, a meu juízo, sem justificativa em civilizações avançadas. E quando me refiro a civilizações avançadas, penso nos mundos superiores proposto entre outras obras na escala dos mundos do Evangelho Segundo o Espiritismo de Allan Kardec.
Estamos hoje, muito distantes da possibilidade de vislumbrar tais mundos, e é neste nosso mundo que construímos nossas idéias e temos possibilidade de crescimento. Assim é aqui a nossa contribuição mais efetiva. Temos o passado como exemplo de aprendizado e a colaboração dos espíritos nos indicando caminhos para a construção do futuro.
Retomando a questão dos mitos.
Acredito, ser a irracionalidade a linha de união entre os mitos clássicos e os da era industrial.
Quando trata do mito do Superman em seu livro “Apocalípticos e Integrados”, Humberto Eco define mistificação como “simbolização incônscia, identificação do objeto com uma soma de finalidades, nem sempre racionalizáveis, projeção na imagem de tendências, aspiração e temores particularmente emergentes num indivíduo, numa comunidade, em toda uma época histórica”.[10]
Segundo o autor, a mitificação existente à época medieval era um ato institucional, de cima para baixo, codificado e decidido pelos homens da igreja. Estes vulgarizavam seus mitos através das grandes enciclopédias da época. É verdade ainda que para elaborarem seus mitos, esses homens de comando do clero, se apropriavam de elementos já correntes nas camadas populares, colhendo aí, certas imagens arquetípicas.
A busca do Mito
esforço hoje existente na arte, e eu diria, no próprio processo de marketing das empresas, é tornar cada vez mais subjetiva a simbologia dos mitos. Isto se contrapõe à conformação dogmática medieval que era bastante direta.
Dessa forma, o criador atual, nessa sua simbolização, sempre mais subjetiva, restringe a ação de sua arte a uma questão de identificação com a sua situação interior por parte do público. Isto, não quer dizer no entanto, a não universalidade da mensagem, pois esta pode tocar em apenas um aspecto do psiquismo humano e atingir milhares de pessoas. A questão reside na não objetividade da mensagem, pois o mito se estabelece a partir da subjetividade.
Segundo Eco, “trata-se da identificação privada e subjetiva na origem entre um objeto ou uma imagem, e uma soma de finalidades, ora cônscias ora inconscias, de maneira a realizar-se uma unidade entre imagens e aspirações”.[11]
Um exemplo bastante claro dessa subjetividade está presente nas peças comerciais ( propagandas ) apresentadas na televisão. Quando assistimos à propaganda de cigarros vemos um belo carro esporte, diversos jovens sorridentes em pranchas de Windsurf, etc..., agregando ao produto uma imagem de esportividade que não lhe é inerente, mas, na verdade, um juízo de valor, um mito estabelecido pela agência de propaganda.
Se o produto em questão, visa atingir uma camada de mais alta renda, é de bom alvitre, a agência trabalhar mais fortemente a questão do “status”, logo, imagens de castelos do Pais de Gales, estradas litorâneas da Itália, Veneza, etc..
Hoje, muito raras são as peças publicitárias que apelam diretamente ao “valor de uso” do produto, trabalham cada vez mais os mitos possíveis de serem ligados a ele.
Muitas vezes a publicidade é até desnecessária para mitificação de determinado produto. Vejamos por exemplo, quantas pessoas conhecemos cuja vida sem um celular seria realmente insuportável? E quantas o tem sem uma justificativa real ? Claro, sempre estas pessoas acabam “explicando” sua “necessidade”.
Na verdade, o que existe não é só o “valor de uso”, chamar e receber telefonemas, mas, a função mítica e subjacente de demonstração do “status” auferido pelo objeto.
Eu não diria, serem todos os bens de consumo em nossa sociedade, elementos plenos de carga mítica, mesmo porque, muitos deles surgiram e existem, para facilitar o dia-a-dia de todos nós, porém, uma série desses bens servem muito mais ao preenchimento de carências em instâncias psíquicas, que verdadeiramente atender às funções propaladas como seu “valor de uso”.[12]
E o Marxismo-Leninismo ?
uando decidi trabalhar sobre os mitos existentes no marxismo-leninismo, isto me pareceu estranho. Quem me conhece, sabe de minhas posições políticas, e de minhas posturas, alguma vezes radicais, em defesa do socialismo. Isto, desde os remotos tempos de atuação no movimento de mocidades espíritas, estando ambos, socialismo e mocidades, em desuso no momento atual, ao que me parece.
Mas, a análise a ser feita não visa o socialismo em si, enquanto concepção de mundo. Pretendo me ater às formas que sociedades como a soviética e a cubana, a partir das premissas iniciais, geraram discursos mitificantes como base para sua sustentação no poder. A essa elaboração teórica chamarei de discurso comunista para uma necessária distinção da proposta socialista.
Assim, há uma diferença entre o discurso comunista elaborado intramuros nessas sociedades, e os preceitos teóricos promotores da Revolução de 1917 na Rússia. É exatamente o discurso elaborado intramuros, o objeto de minha atenção, o quanto tal discurso tem de mitificante, na medida em que absolutiza a verdade como propriedade exclusiva.
Lembro, nos embates eleitorais, quando integrantes do antigo PCB, Partido Comunista Brasileiro, ao fazer sua “boca-de-urna”, abordavam os eleitores dizendo “Vote consciente”. Como se todos os votos, dados a candidatos outros fossem a expressão da falta de consciência, ou como se a consciência fosse atributo cativo das correntes de esquerda.
O pior é que essas pessoas acreditavam ser portadoras da Verdade. Uma verdade absoluta, inquestionável.
Certa vez, encontrei um amigo de Mocidade em uma festa do PCB, ao qual eu fui por participar de movimento de solidariedade aos povos latinos. Assim que me viu Mário disse :
_ Eu sabia, eu sabia que você um dia se iria aperceber do seu erro.
Sorri. Ele acreditava piamente em sua verdade. Deveria ter lido todos os teóricos e vivia pleno de certezas, a partir dos mitos por eles fornecidos.
A minha análise se limitará a fragmentos de discurso retirados do livro “Fundamentos do Marxismo-Leninismo” de G. Chakhnazarov e Iv. Krássine, este último mais conhecido das esquerdas.
Na introdução do livro citado, encontramos uma frase que expressa algo de messiânico para a proposta comunista :
“Qualquer indivíduo precisa de maturidade política e ideológica na sua vida pessoal. Essa maturidade ajuda a evitar os erros e a encontrar o caminho certo.”[13]
Na seqüência estabelece o Marxismo-Leninismo como a alternativa dos países socialistas. Faço ressalvas ao uso desse termo para URSS e Cuba cujo desenvolvimento histórico suprimiu ao cidadão sua livre manifestação.
Falando sobre o marxismo e seu teor materialista o livro coloca :
“A doutrina que considera o mundo como um todo material, que tudo explica a partir da matéria, denomina-se materialista. A forma superior de materialismo é a filosofia marxista.
A classe mais avançada e progressista da sociedade contemporânea é a classe operária. Para lutar contra o capitalismo e construir a sociedade comunista, essa classe tem necessidade duma concepção clara e científica do mundo, razão pela qual o materialismo dialético é o fundamento filosófico da concepção de mundo da classe operária.”
Neste trecho também encontramos uma concepção mitificada da “classe operária”.
Essa classe não foi, é, ou poderá ser, a classe mais avançada e progressista
O próprio teor do seu trabalho a impossibilita de uma reflexão crítica da sociedade ao qual se insere. Após um dia exaustivo de trabalho eu quero a TV, ou qualquer coisa mais leve, que me faça ficar distante de tudo o que se possa chamar trabalho.[14]
Falando da necessidade de uma ideologia :
“A rigor, não há ninguém que não tenha uma ou outra concepção de mundo. Todas as pessoas tem uma idéia do mundo, do sentido da vida. Mas quando essa concepção não é científica, quando parte de conceitos falsos, então não só não ajuda a ocupar a posição correta na vida, mas, ao contrário, pode levar a cometer um erro, às vezes fatal. A concepção marxista-leninista do mundo permite ao homem orientar-se nas circunstâncias difíceis da vida social e pessoal, penetrar a essência das coisas e não julgar apenas pela aparência, que pode ser enganosa. Esta concepção dá a justa orientação não só para resolver os “eternos” problemas filosóficos, mas também para a participação consciente nos assuntos da sociedade e do Estado, na política.”
Meu grifo, nas expressões acima, salienta seu juizo de valor. E, nos diversos textos, sua repetição, sua reiteração ao longo do tempo, através de diversos meios, acaba constituindo, e construído um mito, cuja função é fazer crer às pessoas de sua participação num “momento superior” do processo histórico da humanidade. Isto reduz a possibilidade de questionamento, pois em qualquer que seja a instância, o questionamento é a base da mudança.
A superação do mito
m vista das diversas instâncias míticas anteriormente apresentadas, pudemos perceber a presença do mito em nosso dia-a-dia.
Carregamos hoje, na sociedade tecnológica na qual vivemos, uma herança forte das eras remotas. Tal fato nos é apontado na citação feita por Tarcísio Moura em seu texto “O mito, matriz da arte e da religião”. O autor traz as seguintes palavras do livro “Arte e mito”, de Ernesto Grassi :
“Os povos primitivos a que nos referimos, tão distantes de nós e tão incompreensíveis nas suas reações que já não podemos conceber o seu modo de acesso ã natureza, estão, em verdade, muito mais próximos de nós do que pensamos : em cada um de nós vive - como o demonstrou a psicologia moderna - um homem primitivo, já destituído, é certo, de sua integridade invulnerada e, portanto, despedaçado e dividido.
Porém, nesta mesma divisão, ainda se conservam restos e vestígios da unidade de outrora.”
Se carregamos hoje, elementos herdados do passado no que tange ao sentimento mítico, isto nos leva a crer que não basta a tecnologização da sociedade para promover a derrocada do mito. É necessário algo mais profundo, que o explicite claramente, de maneira a engendrar sua superação. É necessária uma discussão desse mito persistente em nós. Segundo Tarcísio Moura[15] “é justamente por não ter um caráter explicativo, que o mito revela toda a sua pujança de significados. Ele nos relaciona com um nível de expressão mais fundamental que qualquer explicação de ordem científica. E a análise especulativa que se pretenda fazer sobre ele é já, pode-se dizer, a sua destruição.”
Daí temos, como única perspectiva possível, na superação de nossos mitos, o debruçarmo-nos sobre eles, desvendando-os, analisando-os. Segundo o mesmo autor “um mito é antes de tudo uma totalidade que não se pode dividir sem destruir... ...qualquer análise que dele se fizer é já, sua destruição. A análise, para compreender, divide através de estruturas racionais, ora, o mito, sendo essencialmente unidade de vida e pensamento, não chegará a ser compreendido através de tais divisões.”
Para o autor, a análise do mito não basta, por ser tal análise baseada em nossas estruturas racionas, e o mito se calca em aspectos emocionais do ser humano.
Posso concordar ser o mito de ordem subjetiva, emocional, acredito porém, na “elucidação da emoção” através da prática de análise e crítica das estruturas míticas; estejam elas no indivíduo, ou socialmente disseminadas.
Tenho claro, as dificuldades advindas de tocarmos nas estruturas subjetivas, nas resistências internas, nos componentes emocionais que envolvem qualquer alteração. Não fosse assim, já teríamos uma sociedade renovada.
Acredito, por outro lado, na possibilidade da razão, característica forte do homem de nossa era, no transcurso do tempo, solapar as resistências emocionais, ao ponto de estabelecer paulatinamente uma nova forma de sentir.
Evidentemente, tal processo não se dará de forma rápida, anos e anos passarão, talvez algumas encarnações, para o homem se livrar dos horizontes tribais e enquadrar-se numa nova ordem.
Segundo o autor acima citado, “ao querer conquistar todas as funções do mito a razão rompe a unidade e o equilíbrio que antes regulavam atividades do mundo mítico. O advento da modernidade promovido pelo desenvolvimento da razão provocou a emancipação de cada função especializada. Cada uma delas escapando a todo o controle e se desenvolvendo por sua conta com o risco de desequilibrar todo o conjunto”.
“Esta passagem do mito para uma razão progressivamente mais estruturada constitui um dos grandes movimentos evolutivos da história humana, desde seus primórdios até os nossos dias. É a história do caminhar paulatino através do qual a razão vai incorporando e aperfeiçoando todos os tipos de funções. Criando técnicas cada vez mais sofisticadas, ela busca atingir um triunfo completo. Cada época representa para ela um passo a mais nessa direção. Se podemos dizer que estamos hoje pela ciência moderna, no ápice deste movimento, devemos reconhecer que amanhã uma nova estrutura surgirá para que ele não permaneça estacionário.”
O Espiritismo, a partir de Kardec, estabelecendo a primazia da razão, do bom senso, é um elemento importante na crítica ao passado mítico. Através de seus preceitos básicos, principalmente a Lei do Progresso ( Princípio da Evolução Infinita ) nos coloca diante da necessidade de renovação de nossas estruturas no sentido de perseguirmos nossa libertação.
Não somente, como propõe os místicos “das nossas imperfeições”, mas de tudo aquilo que venha significar prisão ao passado. Evidentemente, essa busca de adequação ao tempo presente deve ter em seu âmago a ânsia de progresso, evolução.
“Tudo me é lícito, mas nem tudo me convém” disse o apóstolo Paulo com muita propriedade, e nós, de nossa parte, precisamos buscar saber também o que nos é válido, o que nos convém : seguir adiante acalentando nossos mitos, ou, numa atitude de coragem, romper com eles para crescer na direção do futuro.
No movimento espírita
ara trabalhar o mito, ou os mitos, dentro do Movimento Espírita optei por abordar os dois possíveis aspectos : os mitos conceituais e os mitos pessoais.
Mitos conceituais
Pureza doutrinária
Houve um momento em que diversos setores do movimento espírita estabeleceram a primazia do texto de Kardec sobre qualquer coisa. Tal momento, sob determinados aspectos nos colocou lado a lado com os seguidores da Bíblia, cuja letra morta, para eles, sobrepõe qualquer apelo à racionalidade.
Numa determinada época era comum, em eventos do Movimento Espírita, sairmos para as reuniões carregando o que era chamado o Pentateuco Kardequiano, para se algum incauto atribuísse a Kardec algo duvidoso pudéssemos de pronto “desmascará-lo”.
Atitude desnecessária nos tempos atuais, tempos mais elásticos e complacentes, pela própria evolução das mentalidades.
Necessidade de atuação na área mediúnica
Este é um dos grandes mitos do Movimento Espírita. A mediunidade, sempre tida como um “fenômeno sobrenatural”, deu margem a toda sorte de conjecturas no imaginário popular.
Dentre todas as concepções formadas pelo Espiritismo no Brasil situa-se a idéia do possuidor de mediunidade mais ostensiva se ver obrigado a atuar mediunicamente para a sua vida “seguir nos eixos”.
Idéia herdada das seitas afro-brasileiras, acabou se integrando ao dia-a-dia das diversas casas do movimento espírita organizado no Brasil
Além de não corresponder à verdade dos fatos, tal concepção acaba se estabelecendo como uma forte coerção ao indivíduo médium.
Acredito que possamos catalogar a mediunidade como uma potencialidade natural como outras tantas manifestadas pelo espírito ao longo de sua encarnação.
Seria bastante ridículo alguém me afirmar que se eu não escrevesse ao longo de algum tempo eu me veria sob a influência de espíritos, que minha vida desandaria ou algo parecido.
Isto se afirma porém, no tocante à mediunidade. É uma idéia mítica que compõe as certezas de diversas casas espíritas no Brasil. Mormente naquelas onde o estudo foi deixado de lado, ou nunca esteve em pauta.
_ Meu irmão, se não trabalhar ...
E o interlocutor treme nas bases.
Nada mais falso que tal afirmativa. Mesmo porque as energias utilizadas pelo indivíduo na atividade mediúnica pode muito bem ser canalizada para outra forma de atividade. Ora é uma entidade assistencial a lhe clamar atenção, ora o apoio a um familiar em dificuldade, mais adiante um colega de trabalho ou de escola pedindo um tempo para lhe ouvir os queixumes.
Mecanismos de atuação não nos faltam. Basta estarmos atentos.
Nos sabendo portadores de mediunidade é necessário definirmos se desejamos ou não atuar mediunicamente. Se decidirmos pela negativa estarmos certos de estar agindo segundo os ditames do nosso livre arbítrio.
Lei de Ação e Reação
“Quando eu era criança pensava como criança, agora que sou adulto ...” essas palavras de Paulo nos dão a perceber a necessidade de adequação do nosso pensar à época em que vivemos.
Se a Academia de Ciência de hoje já questiona seus dogmas antes intocáveis, põe que motivo nós, teoricamente menos sectários e dogmáticos não deveríamos colocar um ponto de interrogação em todas as verdades a nós entregues prontas e sem possibilidades de discussão.
Em nossa infância determinadas explicações eram cabíveis. Atendiam às necessidades de perquirição daquele momento. Por certo, no caminho já ficaram várias idéias à medida que novos conhecimentos, novos conceitos se somaram ao nosso saber. Tivemos as idéias da infância, as idéias da adolescência e, os mais idosos, as idéias da maturidade.
A Lei de Ação e Reação é algo desse tipo, teve sua função em determinado momento histórico do Movimento Espírita, não do Espiritismo, era necessário dar conta de todos os questionamentos colocados aos adeptos das novas idéias.
Cumpriu seu papel.
Sem sombra de dúvida fez com que muitas pessoas vissem no Espiritismo uma lógica ímpar, e a partir daí engrossassem suas fileiras.
Porém os tempos são outros, onde os horizontes culturais da humanidade são menos presos a raciocínios esquemáticos e maniqueístas. Não há mais o “bem absoluto” em contraposição ao “mal absoluto”. Foi-se o tempo do “olho por olho e dente por dente”. A humanidade, mesmo nas questões da justiça comum já não se vale apenas das sentenças tradicionais, em certos casos usa de criatividade na aplicação de suas penas.
Cito, a título de exemplo o caso das penas impostas a um jovem pixador de paredes, na qual o juiz estabeleceu serviços à comunidade como forma de pagamento pelos danos causados à sociedade.
Dessa forma nós, para estarmos coerentes com as questões de nosso tempo, deixemos de lado a Lei de Ação e Reação e nos ocupemos de conceitos mais úteis, dinâmicos e instigadores de progresso. Que venham afirmar valores humanistas tão importantes no atual momento histórico.
Expiações e Provas
Outro aspecto de necessária análise é a questão da utilização freqüente da expressão acima. Os mais afoitos dirão :
_ Mas Kardec falou!
Sei das falas de Kardec, sei também, por outro lado; que o tempo passou, a humanidade avançou, e precisa de novos conceitos, novas proposições.
E quem me garante estarmos ainda hoje na mesma fase proposta por Kardec. Creio e espero que não.
Mais grave é que esta expressão estabelece para a Terra a qualidade de ser “um vale de lágrimas”, local só de dor; tudo isto traz ao planeta uma conotação negativa que este absolutamente não tem.
A Terra é apenas a Terra; planeta, nave vagando pelo espaço e abrindo a todos nós, seus habitantes, amplas possibilidades de aprendizado e crescimento.
Sofremos? Sofremos sim.
Porém a culpa de nosso sofrimento não pode ser debitada ao planeta. É coisa nossa, algo representativo do estágio de compreensão da vida em que nos encontramos.
Não aprendemos a viver. Ainda...
Temos o tempo por grande aliado, no entanto, não aprendemos
E mais!
Expiar significa pagar, idéia muito ligada à concepção de pecado. Essas coisas todas que serviram e servem de contenção à humanidade e, através do medo, sentimento de culpa, geraram a infelicidade de muita gente.
Graças a Deus não sou religioso, o Espiritismo me cabe assim como uma luva. Dinâmico, renovador em seus conceitos como a Lei de Evolução, acaba sendo um instigador da busca do novo. Uma busca sempre positiva na medida em que não permite a estagnação do lodo no fundo da lagoa.
Dessa forma não estamos aqui para sofrer, mas, na própria dinâmica da vida aprender. Aprender e apreender conceitos mais amplos, partindo do estreito para o largo; do simples para o complexo; do limitado para o infinito.
Tenho dito com freqüência da impossibilidade que tenho de ver a Deus como um grande capataz a aplicar castigos a seus filhos. Acho tal visão das pessoas uma visão ingênua do Pai, pensar em Deus cobrando cada ato nosso.
Nossa jornada é por nossa conta e risco.
Se cuidarmos dela chegaremos mais cedo à felicidade; se formos preguiçosos, recalcitrantes, vai levar mais tempo. E é só.
De qualquer forma é bom acabermos com essa idéia de expiaçãop uma vez que ela depoe contra o planeta, trazendo-lhe uma aura de morbidez, depressão.
Nada disso!
Mitos pessoais
Se olharmos o Movimento Espírita, se conversarmos mais atentamente com seus diversos componentes, tiraremos dessa conversa muito material para análise, e, sem sombra de dúvida toparemos com algum mito.
Dentre os mitos todos, os mais evidentes são os mitos pessoais. Pessoas que acabamos mitificando por forca das circunstâncias e pela ausência de uma análise crítica.
Um fato freqüente em nossas casas espíritas é o repentino desaparecimento de um ou alguns dos colaboradores.
Em muitas vezes, se formos buscar a raiz de tal “sumiço” será a desilusão com relação a determinada pessoa.
Pois bem!
Eu chego ao Centro Espírita pela primeira vez. Venho pois a dor, já me vergasta a alma de algum tempo, e, no cansaço de sofrer a última alternativa que se me apresentou foi o Espiritismo.
Não é exatamente o que eu quero, mas as pessoas são bondosas, me tratam bem, e tem o Seu Joaquim, quando ele fala parece que conversa comigo. Fala sempre o que eu preciso ouvir.
O quadro acima, mostra um primeiro momento, um quadro psicológico e afetivo pronto para o estabelecimento de um mito individual.
A pessoa em questão, não raro passa a ter certa reverência pelo Seu Joaquim, e além disso percebe não ser a única a lhe disputar as atenções, outras tantas pessoas na casa agem de mesma forma. Sente-se assim “inserida no contexto” como dizia o Pasquim na década de 60.
Do fato de “abelhar” o Seu Joaquim à Idéia de ser ele pessoa sem defeitos é um pequeno passo, dado em curto espaço de tempo. A emoção se encarrega de eliminar toda possibilidade de análise crítica. Se o racional começa a agir na pessoa levantando defeitos visíveis esta pensa:
_ Não, ele é tão bonzinho.
O senso crítico cai por terra. Ao mesmo tempo crescem as possibilidades de crescimento do mito.
O aspecto caricatural do caso acima não pode impedir que façamos uma análise voltada a nós mesmos.
Quantos de nós não carregamos nossos mitos no Movimento Espírita ?
Ora é aquela pessoa dinâmica coordenando as atividades de uma casa, de uma entidade assistencial, Ora é um articulista de jornal fantástico.
Enfim! A cada dia nos confrontamos com pessoas e situações passíveis de se conformarem num mito.
É bom lembrar. O mito é dinâmico; diferentemente do dogma, extático e exterior a nós, o mito por sua dinâmica nos torna coparticipes, construtores ou mesmo parte dele.
Na casa espírita na qual participamos, na nossa cidade ou pais, temos sempre a possibilidade de estar mitificando alguém, deslocando uma pessoa do patamar do real para um pedestal de areia cujos ventos da realidade facilmente trarão ao chão.
Dessa forma, convém nos acautelarmos. As desilusões saem mais caro e causam maiores turbulências que a caminhada nas sendas da racionalidade.
Mas então, como facear os mitos existentes no movimento espírita, se esse movimento, pela própria ausência de discussão mais aprofundada, deixa de lado a necessária auto-análise, tornando-se por esse motivo incapaz de percebe-los?
Como olhar a forma que as pessoas se colocam ante determinados médiuns como Chico Xavier, Arigó, Divaldo Pereira Franco, e mesmo em relacão a espíritos como Bezerra de Menezes, Emannuel e André Luis, dando margem inclusive ao surgimento do Emannuelismo, do André Luisismo, e tantos outros ismos mais, que nada acrescentam à dinâmica da idéia espírita, sendo-lhe, a bem da verdade um desservico na medida em que afasta do Centro Espírita e por conseguiente do Movimento Espírita pessoas de senso crítico mais apurado.
Proposta final
Minha proposta para o movimento espírita, é que se criem instâncias de discussão sobre o tema, instâncias estas capazes de alertar aos diversos participantes das casas espíritas, quão presente é o mito em nossa sociedade atual.
Mas isso, por si só, trará a superação do mito ? - me perguntará um leitor mais afoito.
Responderei com um sonoro NÃO. Porém, iniciará um processo de discussão, processo inicial de aclaramento das consciências para o estabelecimento da dúvida. Uma vez estabelecida, a dúvida funciona como um elemento a corroer as bases da certeza, sustentáculo do edifício mítico. Certamente, tais discussões, não serão como fogo a se alastrar em campo seco; serão focos, pequenos focos, a deitar luz à região em sua proximidade.
O mais importante a meu ver, é o surgimento de tais focos, é o nascer da discussão.
Estivemos falando e trabalhando, não para o movimento espírita como um todo, porém visando setores, segmentos, grupos capazes de estabelecer uma análise critica de suas práticas quotidianas e a partir da mesma começar um processo dinâmico de mudança.
Aos outros, que preferem o passe ao pensar, deixaremos o veredicto do tempo.
Referências bibliográficas
• Bakhtin, Mikhail “Marxismo e Filosofia de Linguagem”, Hucitec, São Paulo, 1981
• Barthes, Roland “Mitologias”, DIFEL, São Paulo, 1982
• Campbell, Joseph “As transformações do mito através dos tempos”, Cultrix, São Paulo-SP, 1991
• Eco, Humberto “Apocalípticos e Integrados”, Perspectiva, São Paulo, 1979
• G.Chakhnazárov, Iú.Krássine “Fundamentos do Marxismo-Leninismo” Edições Progresso, São Paulo, 1981
• Morais, Régis ( org. ) “As razões do mito”, Papirus, Campinas SP, 1988
Cesar, Constança Marcondes “Implicações contemporânas do mito” in As razões do mito, p. 37-38.
Campbell, Joseph “As transformações do mito através do tempo”, p. As Leis Naturais, segundo Kardec abarca as leis físicas do âmbito das ciências oficiais, e as leis morais do âmbito das concepções filosófico-religiosas.
Gusdorf, Georges “Mito e metafísica”
Vale a pena, como referencial, a leitura dos dois primeiros capítulos do livro “O Espírito e o tempo”de José Herculano Pires onde este analisa a relação existente entre os fenômenos mediúnicos e a análise levada a cabo pelos povos primitivos.
Barthes, Roland “Ideologias”, p. 132
Bakhtin, Mikhail “Marxismo e Filosofia de Linguagem”, p. 34
Bakhtin, Mikhail “Marxismo e Filosofia de Linguagem”, p. 31-32
idem, p. 32
Eco, Humberto “Apocalípticos e Integrados” p. 239
Eco, Humberto “Apocalípticos e Integrados” p. 242 Valor de uso e Valor de troca são conceitos marxistas, onde o valor de troca é o valor monetário de um bem. E o valor de uso é o aspecto de funcionalidade intrínseca. Assim, o valor de uso de uma geladeira é conservar alimentos, enquanto seu valor de troca é R$xxx,xx nas Casas Bahia.
G.Chakhnazárov, IúKrássine “Fundamentos do Marxismo-Leninismo”, p. 6.
Vale lembrar aqui o conceito espírita, que estabelece trabalho como toda ocupação útil.
Moura, Tarcísio in “As razões do Mito”, p. 50


Mito e Razão: "a porta para o logos"
Contribuições clássicas
O histórico da busca de uma realidade inteligível, "a porta para o logos", é envolvida pelo mito. Desde o século VI a.C., os gregos da Jônia estavam a procura de uma substância primária, de um material básico do qual, segundo argumentavam, todas as coisas haviam se desenvolvido. Três homens, todos de Mileto e todos astrônomos e matemáticos, tinham suas teorias a esse respeito. Tales opinava que o material básico era um liquido claro; Anaxímenes pensava que era um gás incolor e Anaxímandro julgava que fosse alguma substância indeterminada, ilimitada e imperecível. Ao mesmo tempo, outro grupo de homens jônicos fazia especulações sobre a natureza da própria vida. Procuravam, estes grandes pensadores, um princípio único e unificador que explicasse porque as coisas são que o são (4).
Um desses homens era Heráclito, que vivia em Éfeso. Heráclito acreditava que a condição essencial da própria vida era o "fluxo", isto é, o fato de que nada era absoluto e tudo mudava. Pitágoras, que nasceu em Samos, mas residiu a maior parte de sua vida na colônia grega de Crotona, Itália, acreditava que o universo era ordenado por um sistema harmonioso de números. Desses conceitos nasceu o Teorema de Pitágoras.
O terceiro desses primitivos filósofos foi Xenófanes, que, forçado a sair de sua terra na Jônia por uma invasão persa, estabeleceu-se em Eléia, na Itália. Xenófanes fundou uma escola filosófica, onde ensinava que o universo era ordenado por um ser único, supremo e divino, que agia exclusivamente por meio do pensamento (5).
Embora esses primeiros cientistas e filósofos dessem a maior importância ao seu trabalho e não hesitassem em rejeitar os velhos mitos sobre os deuses, se os mesmos estivessem em desacordo com suas teorias, ainda acreditavam em alguma direção divina do mundo. Se tivessem que desacreditar no velho mito criariam um novo para lhe tomar o lugar. Não se pode denominar esses métodos de científicos. Trabalhando no próprio alvorecer da Ciência, agiam principalmente por meios de rasgos de intuição e de inspiradas conjecturas. Não obstante, alguma das suas conclusões são espantosas. Anaxímandro, por exemplo, afirmou que o mundo era apenas uma série interminável de mundos; Xenófanes declarou que o homem tinha saído originalmente do mar e apresentou fósseis como prova. Xenófanes, foi, desse modo, um precursor da moderna afirmação científica sobre o assunto (6).
Entre os gregos, a procura do conhecimento científico dava tanto prazer como a apreciação das artes. Não faziam distinção entre o amor da beleza e o amor da verdade. A idéia de beleza é densa (Kalos, Kaloi) = Belo - Bem - Verdadeiro, supõe a busca contínua pela perfeição. O mito fornece a tônica das relações entre deuses e homens e do entendimento da harmonia das formas, a busca determinante pelo equilíbrio. Essa busca está presente, principalmente entre os séculos V e IV a.C. na construção dos templos, no teatro, na poesia, nas artes de modo geral. Esse sentido reflete a obrigação do homem de tirar o máximo proveito de seus dons naturais: "tudo o que valia a pena fazer, devia ser bem feito" (7) e, assim, até mesmo os vasos mais simples têm um notável toque de distinção. Até objetos utilitários, como moedas, são pequenas obras-primas em relevo em ouro e prata. Nesse contexto, visão científica ou filosófica, relações diretas (uma ponte) entre Arte e Vida estavam em conexão.
Na escultura, esse sentido de fina execução era inspirado e reforçado por algo mais sublime. A escultura grega tinha de ser digna dos deuses e estar inserida nas proposições mitológicas. Deveria também ser vista nos lugares, públicos sobretudo nos templos. Era preciso que tivesse nobreza e dignidade, sem contudo distanciar-se das coisas do cotidiano; acreditava-se que os deuses estavam, com freqüência, intervindo nas mesmas. Tudo isso explica porque a Arte Grega, em seu maior brilho, evitava efeitos violentos e grosseiros. Ao contrário, mostra os homens em pleno vigor de seus corpos ágeis e musculosos, e mulheres envoltas nas ondulantes roupagens dos seus mais finos vestidos.
Os gregos, povo despido de inibições ao falar de si mesmo, sentiam prazer nas palavras. Possuíam à sua disposição uma língua sutil, expressiva e adaptável, da qual faziam pleno uso. Como se deu com muitos outros povos, além da profusão de personagem mitológicos, a poesia chegaria a ser quase "uma segunda religião". Havia na sua criação, todo o cuidado e penetração que se aplicavam as artes visuais. Os poetas eram muito prezados - um poeta, para o filósofo Sócrates, era uma "coisa luminosa, alada e sagrada" (8). Escreviam sobre toda espécie de temas: agricultura, costumes locais, mitologia. Um homem, qualquer homem, quando tinha algo importante para dizer, quase sempre se expressava em verso - cantando ou declamando - nos primeiros tempos, com o acompanhamento de música.
A poesia era a reação imediata dos gregos a um amplo campo de buscas e experiências. Como reflexo dessa variedade, criaram ou aperfeiçoaram formas poéticas conhecidas até hoje. É possível que tenham começado com a epopéia heróica, que é a narração, em versos, de acontecimentos empolgantes, trágicos, povoados de heróis, deuses e mortais comuns. Continuaram com uma poesia mais pessoal e sentimental, cantada ao som da lira e que é, por isso, chamada lírica. No seu apogeu os gregos inventaram a Tragédia e a Comédia: a primeira tratava obscuras e difíceis relações entre os deuses e os homens, e a segunda apresentava, em linguagem picante e burlesca, toda sorte de fraqueza humana.
O apogeu dessa tradição criadora, alimentada pela Mitologia, foi atingido na última parte do século VIII a. C., na pessoa de Homero. Pouco se sabe de Homero. Julga-se que viveu em Esmirna ou na Ilha Quios. Suas obras-primas marcam o amanhecer da literatura européia. As epopéias anteriores deram a Homero um material narrativo e uma forma métrica que posteriormente se tornou o metro da poesia épica grega, o hexâmetro dactílico (9).
Porém, os poemas homéricos são muito mais que magnífica poesia. A Ilíada e a Odisséia tornaram-se os livros fundamentais da cultura grega e Homero foi considerado posteriormente pelos gregos um dos fundadores de sua história, filosofia, drama, poesia e ciência. Os seus temas foram uma fonte inesgotável de inspiração para artistas e oradores gregos. Hoje, ele constitui documento fascinante de informações sobre o mundo grego, como era no seu tempo e o mundo como ele pensava que fora nos tempos micênicos.
Embora tivesse aproveitado os mitos que lhe haviam chegado através dos séculos, Homero acrescentou muito do que era propriamente seu. Tomou as histórias primitivas de monstros canibais e riscos desesperados e animou-as com uma generosa e delicada ou rica visão da vida. Entre as antigas narrativas existe uma homem errante que é arremessado à costa pelo mar, sendo salvo por uma princesa com quem se casa. Ulisses, o homem errante de Homero, é salvo por uma encantadora princesa, Nausica, mas não se casa com ela. Ulisses tem uma esposa na pátria e, desse modo, em vez de casamento, desenvolve-se uma comovente amizade entre o acossado marinheiro e a jovem princesa.
Os seus ouvintes, provavelmente, não queriam se não histórias de heroísmo. Mas Homero lhes dava uma visão completa do mundo, de deuses nas suas tarefas determinadas, de homens e mulheres em marcha para os seus destinos, de todas as atitudes da vingança sinistra à farsa hilariante, de palácios e jardins, de ilhas remotas e praias rochosas. Por trás de todas as referências mitológicas, a sua imaginação está em ação, procurando ver os seres humanos como realmente são, compreendendo por que fazem o que fazem; retratando-os com profundeza mesmo quando são maus com calor e afeição (10).
Portanto, para Homero o mito franqueava inteligibilidade, conhecimentos: era "porta para o logos".
Os mitos continuam sendo "a porta para o logos"?
E "os mitos contemporâneos" como atuam?
Hoje, observa-se que a retomada de Homero vem acompanhada de registros que, cada vez mais, estão sendo comprovados. É notório que Homero usa exemplos míticos para todas a situações imagináveis da vida em que o homem pode estar na presença de outro, para aconselhar, advertir, admoestar. Tais exemplos não se encontram de ordinário, na narração, mas sim nos discursos dos personagens épicos. O mito serve sempre de instância normativa para a qual apela o orador. Não tem caráter meramente fictício, dá margem a fantasia criadora, à sensibilidade estética. Há no seu âmago uma validade universal (11).
Atualmente, a pesquisa científica das diversas áreas continua reexaminando não apenas os épicos de Homero, porém o grande acervo clássico como um todo. Ao lado do saber proporcionado pelos cientistas, filósofos, dramaturgos e a beleza das obras-primas, tem-se como certo de que as citações épicas vão além do mito. Dados e novas descobertas que se somam, vão tirando personagens do anonimato, ou confirmando lugares de suas presenças. Tem-se, por exemplo, mais de vinte mil personagens com registros em fragmentos de cerâmicas (ostraka). Ao lado de figura ilustres como Péricles, Aristídes, surgem novas, com freqüência (12).
Essas sinalizações motivam contínuas retomadas das questões inseridas na força de mitos primordiais que traçaram a fisionomia de homens e povos. Pensadores contemporâneos, correntes psicanalíticas, estudiosos da astrofísica, momentos artísticos diversos não se furtam a esse acervo. Entre os séculos XVIII e XIX, ingleses e franceses, depois de saques, aumentam as coleções de seus museus "com deuses e deusas". Esses inspiraram reformulações urbanísticas e obras artísticas. Pensadores como Goethe e Hegel aprofundaram suas idéias através desse referencial. Já no século XX, Freud vasculha a emergência do mito, incluindo a sua força simbólica.
Dessa forma, pode-se indagar: a passagem de uma consciência mítica para o logos continua envolvendo a todos? Onde começa a diversidade entre os homens? Onde terminam as questões de identidade? O que há de comum e de diverso entre gregos e romanos; entre orientais e ocidentais; latinos e saxões, ou entre latinos americanos do sul e do norte? Por que, no encontro de culturas diversas, uma absorve a outra, impondo-se como única de ser, agir, ou de entender estilos e a própria visão do mundo ou do cosmo? Nos campos da Ciência e da Arte, o acervo primordial ainda faz sentido como referencial?
As questões podem continuar a serem levantadas: o mundo que se informatiza gesta novos mitos? O mundo vitrini e a realidade virtual criam novos personagens? As pesquisas bio-tecnológicas, clonagem, a robótica não estão criando "novos heróis, deuses e semi-deuses"? Décadas atrás, a pop art referia-se aos novos mitos que emergiam da sociedade de eletrodomésticos e da publicidade como os "novos barroquismos urbanos" (13). Tendências pós-modernas assinalam a presença do mito clássico, como "saudade do lar distante" ou de antigos lugares do mediterrâneo. Naturalmente, os mitos assumem novas configurações e sentidos. No contexto atual, quais aspectos podem ser assinalados? Quais as possibilidades emergentes de conectá-los com Arte e Ciência?
Notas:
1. JENCKS, Charles. Post-modernism - the new classiscism in art and architeture. London Academy, 1987, p. 33 e seguintes
2. CRIPPA, Adolpho. Mito e Cultura. São Paulo, Convívio, 1975, p. 15 e seguintes
3. JAEGER, Werner. Paidéia. São Paulo, Martins Fontes, 1979, p. 179 e seguintes
4. PESSANHA, José Américo Mota (cons.). Os pré-socráticos vida e obra (Col. Os Pensadores), São Paulo, Nova Cultural, 1996, p. 14.
5. Idem, p. 23 e seguintes.
6. Ibidem, p. 25 e seguintes.
7. BAYER, Raymond. Historia de la estetica, México, Fondo de Cultura, 1965, p. 222 e seguintes.
8. PESSANHA, José Américo Mota. In: Sócrates (Coleção Pensadores) São Paulo, Nova Cultural, 1996, p. 10 e seguintes.
9. JAEGER, Werner. Op. cit., p. 34 e seguintes.
10. Idem, p. 62 e seguintes.
11. CAMPBELL, Joseph (org.) Mitos, sonhos e religião - nas artes, na filosofia e na vida contemporânea. Rio de Janeiro, Ediouro, 2001, p. 139 e seguintes.
12. BOWRA, Maurice. Grécia Clássica, Rio de Janeiro, José Olympio, 1969, p. 11 e seguintes.
13. ROUANET, Sérgio Paulo. As razões do Iluminismo. São Paulo: Companhia das Letras, 1987, p 265 e seguintes.
Bibliografia:
CAILLOIS, Roger. O Mito e o Homem, Lisboa, Edição 70, 1979.
CRIPPA, Adolpho. Mito e Cultura, São Paulo, Convívio, 1975.
DORFLES,Gillo. Novos Ritos, novos mitos, Lisboa, Edições 70, 1965.
CAMPBELL, Joseph. com BILL MOYERS; FLOWES (BETTYSVE org.) O poder do mito, São Paulo. Palas Athenas, 1996.
LÉVI-STRAUSS, Claude. Mito e Significado, Lisboa, Edições 70, 1979.
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CRIPPA, Adolpho. Mito e Cultura. São Paulo, Convívio, 1975.
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PESSANHA, José Américo Mota (consultoria). Os pré-socráticos vida e obra (Coleção Os Pensadores), São Paulo, Nova Cultural, 1996.
BAYER, Raymond. Historia de la estetica, México, Fondo de Cultura, 1965.
PESSANHA, José Américo Mota. In: Sócrates (Coleção Pensadores) São Paulo, Nova Cultural, 1996.
CAMPBELL, Joseph (org.) Mitos, sonhos e religião - nas artes, na filosofia e na vida contemporânea. Rio de Janeiro, Ediouro, 2001.
BOWRA, Maurice. Grécia Clássica, Rio de Janeiro, José Olympio, 1969.
ROUANET, Sérgio Paulo. As razões do Iluminismo. São Paulo: Companhia das Letras, 1987.
ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia, São Paulo: Martins Fontes, 1998.
WILSON, Simon. Arte pop, Barceolona: Labor, 1995.

Em relação ao texto educação escolar e cultura:

UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA
DISCIPLINA: HISTORIA DA EDUCAÇÃO
PROFESSORA: NIALVA
ALUNA: MILENA BORBA


Em relação ao texto educação escolar e cultura:

1- Leia o texto o conceito de cultura elaborada por Faundez, para podermos compreender melhor esta questão:

“A identidade cultural de um povo renova –se e se enriquece em contato e valores de outros povos”.
Por tanto destaque do texto:

a) Conceito de multiculturalidade.

R= Multiculturalismo é um termo típico do mundo globalizado que tem como objetivo lutar contra a intolerância e a favor das políticas publicas,garantindo , assim os direitos a pela diferença, afinal existe muitas maneiras de se viver a vida em sociedade, e o mais importante é aprendemos com o outro respeitando em sua totalidade.

b) A dinâmica intercultural supõe a promoção de um autentico dialago entre culturas.
R= Exige reconhecimento mútuo, convivência entre pessoas e grupos originados de distintas culturas, sendo capazes de assumir, sem romantismo e idealismo, a riqueza, tensões e conflitos inerentes a esse relacionamentos.

2- Infelismente, se eu te puser numa escola vão fazer você rejeitar a sua classe social, ao ladinizar, você quer dizer que isto eu não quero para você, por isto não te coloco na escola.
R=Este tipo de assunto levanta qualquer duvida sobre a forma de dramática, os temos das relações entre escola e a cultura (s). Muitos grupos sociais vivam inquietação semelhantes, algumas vezes sem poder explicita-la com muita precisão porém, conceito de que há , com excessivamente frequênciado, uma ausência da conezão entre o universo escolar e as culturas (s) de seus atores e do contexto em que se situa.
3- Aplique os conceitos que considerar adequados justificando suas resposta:
a) O estudo é uma instituição que esta a serviço de todos;
R= Sim. Pois todo tem o direito de estudar, trata-se de uma perspectiva em construção que pessoal. Pois ensina as crianças a pensarem e colocar as suas idéias em praticas.
b) Isto é legal, portanto justo e legitimo;
R:Sim,pois o lugar de toda a criança e jovem é na escola.Toda criança e jovens tem o direito de estudar.O direito é para todos.

4- Analise o aspecto ideológico da seguinte afirmação.

“As diferenças sociais existem devido à diferença de natureza, talento e esforço”.
Por tanto, pode-se observar que geralmente são pobres Por serem incompetentes;
Preguiçosos, pouco esforçados.

R= Não concordo. Pois as pessoas julgam as pessoas sem saber, isso acontece não só fora da escola dentro da escola. Por tanto a ideologia que estudamos é formativo, cujo as funções de classes sociais, política e cultura... As sociedades julgam muitas as pessoas por elas não terem um.Isso faz uma ideologia por classe social. A ideologia é apagar as diferenças que existem entre a classes e fornecer ao membro sentimentos de igualdade social encontrando certos referencias.
5- Justifique a ideologia dos seguintes provérbios:
a) “De grão em grão a galinha encho o papo”.
R= O Princípio do Grão em Grão por si é apenas um filtro perceptivo, um conjunto de palavras que nos faz prestar atenção em algo de uma certa maneira, sob um certo enfoque. Bom mesmo é quando o usamos para algum propósito. Vamos ver alguns casos no nível individual, isto é, em que o maior beneficiado é você, e alguns outros nas dimensões sociais e ambientais, em que as vantagens podem ser pequenas no nível pessoal, mas significativas no nível coletivo.
b) “Cada um por si,Deus por todos”.
R: É um pensamento egoísta, quer dizer que ele esta pensando em si próprio. É que em consistem em contar realmente o que realmente aconteceu,durante a presença dos outros,mas no entanto vive pensando só em si própria.E por isso acaba se afastando do mundo ao qual pertence.

c) “Cada macaco no seu galho”.
R= Quer dizer que é um ditado egoísta que só pensam em si. Posso solicitar um exemplo: Na época de política que os políticos fazem promessa, mas na verdade ele não esta pensando no povo que vai votar nele. Mas em si própria que quer chegar ao poder.


6- Justifique o poema de Bertolt Brecht; “ Isso é natural”.
R= Temos, então, a primeira conclusão do que é o medo. O medo é uma força natural, não é o meu ou o seu medo, é o medo. O medo existe de forma independente das pessoas, ou seja, há algo em nós e também fora de nós que se chama medo, e que tem uma função na natureza como poderia ter o Sol, a Lua, a Água, a Terra ou qualquer elemento. O medo faz parte da natureza e tem como função proteger, por incrível que possa parecer. Resiliência é a idéia de que a gente cresce em função das adversidades da vida. Quem tem uma vida perfeita, sem conflitos, está pouco preparado para ter flexibilidade, idéias criativas para ultrapassar os obstáculos, transformar uma dificuldade em um desafio, lutar e aprender com isso. É desse jeito que o ser humano cresce. Porque adversidades, ao longo da vida, sempre virão. Temos de lidar com doença, assalto, perdas de todos os tipos.

Educação no Brasil

Educação no Brasil
Educação, informações para professores, analfabetismo, taxa de escolaridade no Brasil, Educação Básica, Educação Infantil, LDB ( Lei de Diretrizes e Bases da Educação), dados estatísticos.

Atualmente, considera-se a educação um dos setores mais importantes para o desenvolvimento de uma nação. É através da produção de conhecimentos que um país cresce, aumentando sua renda e a qualidade de vida das pessoas. Embora o Brasil tenha avançado neste campo nas últimas décadas, ainda há muito para ser feito. A escola ou a faculdade tornaram-se locais de grande importância para a ascensão social e muitas famílias tem investido muito neste setor.

Pesquisas na área educacional apontam que um terço dos brasileiros freqüentam diariamente a escola (professores e alunos). São mais de 2,5 milhões de professores e 57 milhões de estudantes matriculados em todos os níveis de ensino. Estes números apontam um crescimento no nível de escolaridade do povo brasileiro, fator considerado importante para a melhoria do nível de desenvolvimento de nosso país.
Uma outra notícia importante na área educacional diz respeito ao índice de analfabetismo. Recente pesquisa do PNAD - IBGE mostra um queda no índice de analfabetismo em nosso país nos últimos dez anos ( 1992 a 2002 ). Em 1992, o número de analfabetos correspondia a 16,4% da população. Esse índice caiu para 10,9% em 2002. Ou seja, um grande avanço, embora ainda haja muito a ser feito para a erradicação do analfabetismo no Brasil.
Esta queda no índice de analfabetismo deve-se, principalmente, aos maiores investimentos feitos em educação no Brasil nos últimos anos. Governos municipais, estaduais e federais tem dedicado uma atenção especial a esta área. Programas de bolsa educação tem tirado milhares de crianças do trabalho infantil para ingressarem nos bancos escolares. Programas de Educação de Jovens e Adultos (EJAs) também tem favorecido este avanço educacional. Tudo isto, aliado a políticas de valorização dos professores, principalmente em regiões carentes, tem resultado nos dados positivos.
Outro dado importante é a queda no índice de repetência escolar, que tem diminuído nos últimos anos. A repetência acaba tirando muitos jovens da escola, pois estes desistem. Este quadro tem mudado com reformas no sistema de ensino, que está valorizando cada vez mais o aluno e dando oportunidades de recuperação. As classes de aceleração também estão dando resultados positivos neste sentido.
A LDB ( Lei de Diretrizes e Bases da Educação ), aprovada em 1996, trouxe um grande avanço no sistema de educação de nosso país. Esta lei visa tornar a escola um espaço de participação social, valorizando a democracia, o respeito, a pluralidade cultural e a formação do cidadão. A escola ganhou vida e mais significado para os estudantes.

O desafio que a educação permanente tem em si: a pedagogia da implicação

Neste texto Ricardo faz um desafio: a produção do cuidado em saúde e sua micropolítica são constituídas de práticas pedagógicas, e não só de ações tecnológicas típicas da construção de atos de saúde, no senso estrito; portanto, toda aposta que visa interferir no campo de produção da saúde tem de reconhecer isso como uma necessidade para a ação. Este autor, dando conseqüência a esta noção, propõe uma problematização sobre a educação em saúde, advogando com muitos outros a idéia da educação permanente e passando a reconhecer que: "torna-se crucial o desenvolvimento de recursos tecnológicos de operação do trabalho perfilados pela noção de aprender a aprender, de trabalhar em equipe, de construir cotidianos eles mesmos como objeto de aprendizagem individual, coletiva e institucional."
Creio que este desafio nos permite a construção de uma grande pauta de discussões e reflexões e, até mesmo, de novas produções teóricas. Entretanto, aqui e agora, estou estimulado por duas idéias em particular, para olhar o que considero nuclear no desafio proposto.
Uma delas, refere-se a um fenômeno bem comum entre nós. Não é possível sustentarmos mais as quase exclusivas visões gerenciais que se posicionam sistematicamente pela noção de que a baixa eficácia das ações de saúde é devida à falta de competência dos trabalhadores e que pode ser corrigida a medida que suprimos, por cursos compensatórios, aquilo que lhes falta. Diante desta visão do problema, estes gestores passam a propor cursinhos à exaustão, que consomem recursos imensos e que não vêm gerando efeitos positivos e mudancistas nas práticas destes profissionais.
Óbvio que, aqui, não estou jogando a criança com a água do banho; há treinamentos que são necessários para a aquisição de certas técnicas de trabalho, mas isso é pontual e pode ser suprido sem muita dificuldade. O que aponto é a necessidade de olharmos de outros modos explicativos para esta relação em dobra: educação em saúde e trabalho em saúde, na qual é impossível haver separação de termos. Um produz o outro. Com efeitos fundamentais tanto para a construção da competência do trabalhador, quanto para a expressão de seu lugar enquanto sujeito ético-político produtor de cuidado, que impacta o modo de viver de um outro, material e subjetivamente constituído (o usuário, individual e/ou coletivo). Aliás, estas questões já vêm sendo objeto de preocupações da própria equipe de trabalho da qual o Ricardo faz parte.
O projeto do Ministério da Saúde, do Governo Lula, sobre os Pólos de Educação Permanente vem constituindo uma forma de construir um terreno para a problematização necessária da mudança do conjunto das práticas dos gestores da saúde quanto a suas intervenções no campo da educação em saúde, enquanto pauta nacional. Como instância do SUS, esses Pólos não necessariamente respondem de modo uniforme a esta pauta, pois a instalação de múltiplos atores loco-regionais lhe dão singularidades que não podem ser desprezadas. Mas o terreno e o sentido da política estão aí instalados, cabendo aos atores concretos resolvê-los nos seus modos de produzir o SUS, no Brasil. Não há solução para estes processos à parte daquela que é encontrada para a constituição do SUS como institucionalidade. A multiplicidade desta se expressa também nos Pólos.
Esta dimensão está articulada ao desafio que Ricardo provoca e a tocarei na reflexão da minha segunda grande questão, que tem a ver, no meu ponto de vista, com o tipo de prática de educação que deve ser induzida, que deve ser construída, nos marcos deste debate da educação permanente. Ou seja, tem a ver com certo posicionamento necessário em relação ao modo de encarar a construção das ações no campo da saúde e da educação, implicadas com a visão em dobra destes dois territórios de práticas sociais, já citada anteriormente.
Ricardo aponta isso em vários momentos de seu texto, reafirmando a importância do lugar do trabalhador como protagonista efetivo deste processo: "à área da formação, então, não mais um lugar secundário ou de retaguarda, mas um lugar central, finalístico às políticas de saúde. A introdução desta abordagem retiraria os trabalhadores da condição de "recursos" para o estatuto de atores sociais das reformas, do trabalho, das lutas pelo direito à saúde e do ordenamento de práticas acolhedoras e resolutivas de gestão e de atenção à saúde."
Quando fala da pedagogia do processo que possa estar articulado a este novo agir, aponta como dispositivos analisadores, que podem instituir novas lógicas no agir do trabalhador, o "quadrilátero da formação", apostando que ele pode cumprir este núcleo do desafio, procurando mostrar a possibilidade auto-analítica desses componentes.
De modo correto, mostra que todo processo que esteja comprometido com estas questões da educação permanente tem de ter a força de gerar no trabalhador, no seu cotidiano de produção do cuidado em saúde, transformações da sua prática, o que implicaria força de produzir capacidade de problematizar a si mesmo no agir, pela geração de problematizações "– não em abstrato, mas no concreto do trabalho de cada equipe – e de construir novos pactos de convivência e práticas, que aproximem os serviços de saúde dos conceitos da atenção integral, humanizada e de qualidade, da eqüidade e dos demais marcos dos processos de reforma do sistema brasileiro de saúde, pelo menos no nosso caso."
E aí está o cerne de um grande novo desafio: produzir auto-interrogação de si mesmo no agir produtor do cuidado; colocar-se ético-politicamente em discussão, no plano individual e coletivo, do trabalho. E isto não é nada óbvio ou transparente.
Não me parece que para gerar "auto-análise e autogestão dos coletivos" o "trabalho com eixo na integralidade" tenha força em si, ou mesmo, que "as consultorias, os apoios, as assessorias quando implementadas" tenham capacidade de gerar isso com os analisadores (do quadrilátero) da Educação Permanente em Saúde, se não conseguirem atingir a alma do operar ético-político do trabalhador e dos coletivos na construção do cuidado, que é o modo como estes dispõem do seu trabalho vivo em ato, enquanto força produtiva do agir em saúde.
Parece que estamos diante do desafio de pensar uma nova pedagogia - que usufrua de todas as que têm implicado com a construção de sujeitos auto-determinados e comprometidos sócio-historicamente com a construção da vida e sua defesa, individual e coletiva – que se veja como amarrada a intervenção que coloca no centro do processo pedagógico a implicação ético-político do trabalhador no seu agir em ato, produzindo o cuidado em saúde, no plano individual e coletivo, em si e em equipe.
Colocar isto em análise, cobra dos dispositivos analisadores (os do quadrilátero) uma certa amarração com os componentes nucleares da micropolítica da produção do cuidado em saúde, individual e coletivo. Isto significa que o analisador tem de ter a potência de expor o trabalho vivo em ato para a própria auto-análise e pedagogicamente abrir espaços relacionais para poder se falar e se implicar com isso.
Esta pedagogia da implicação, parece-me inseparável do desafio que Ricardo aponta para a Educação Permanente. Construí-la no cotidiano dos serviços de saúde e como eixo ordenador de ações nos Pólos deve ser uma perseguição implacável para quem quer efetivamente mudar o modo de se fabricar saúde, entre nós.
Por isso, aponto que para a educação permanente de fato tornar-se um bom desafio, faz-se necessário trabalhar este outro desafio em si, ainda muito em aberto, e que pede para ser enfrentado de modo mais ampliado do que já se tem de elaboração.


Interculturalidade e Educação Escolar
Candau, V. M.

Vivemos uma época em que a consciência de que o mundo passa por transformações profundas é cada dia mais forte. Esta realidade provoca em muitas pessoas e grupos, sentimentos, sensações e desejos contraditórios, ao mesmo tempo de insegurança e medo, potenciadores de apatia e conformismo, como também de novidade e esperança, mobilizadores das melhores energias e criatividade para a construção de um mundo diferente, mais humano e solidário.

Esta dialética é especialmente aguda na América Latina, em que o sonho de afirmação de uma sociedade democrática e igualitária, "um mundo em que todos os mundos tenham seu lugar", nas palavras do Comandante Marcos (Chiapas), esbarra diariamente com o projeto neoliberal hegemônico e o avanço de reformas estruturais que acentuam a marginalização e a exclusão, em nome da abertura dos mercados e do sonho de entrar no "primeiro mundo".....

Neste processo crescente de exclusão, que assume novas caras e dimensões no continente, os mais afetados são os "outros", os diferentes, os que não dominam os códigos da modernidade, não têm acesso ao processo de globalização em suas diferentes dimensões, estão configurados por culturas que se resistem a colocar no centro a competitividade e o consumo como valores fundamentais da vida, pertencem a etnias historicamente subjugadas e silenciadas, questionam os estereótipos de gênero presentes nas nossas sociedades, lutam diariamente pela sobrevivência e pelos direitos humanos básicos que lhe são negados.

Como exemplo trágico destes processos de discriminação e exclusão presentes no continente e não sempre reconhecidos, podemos citar a morte de um índio Pataxó, em 1997, em uma das ruas de Brasília, cidade símbolo de modernidade, incendiado por jovens de classe média alta que, para justificar o seu crime, declararam não saber que se tratava de um índio e que pensavam ser "apenas" um mendigo... No entanto, no meio destas contradições e conflitos, cresce a consciência do caráter multicultural do continente e de cada um dos nossos países. Talvez o novo deste fenômeno seja o seu caráter afirmativo e propositivo. Faz muito tempo que sabemos que a miscigenação é um dos traços de nossa formação histórico-cultural, que os povos originários e os afro-americanos são testemunhas do massacre realizado ao longo dos últimos quinhentos anos, assim como de resistência e fortaleza, que os processos de "hibridização cultural" (Garcia Canclini) se multiplicam e acentuam no continente. Mas, em geral, associávamos esta realidade a uma valência negativa, a algo que nos impedia de gerar processos de desenvolvimento e de afirmação de identidades próprias em pé de igualdade com diferentes povos e nações.

Me atreveria a afirmar que é esta perspectiva que está mudando, pelo menos em grupos significativos de nossas sociedades, especialmente aqueles aos que é negado o acesso pleno à cidadania e à democracia. Suas vozes se fazem ouvir, surda, clara ou violentamente. E a sociedade começa a se preocupar pela construção de dinâmicas sociais mais inclusivas e participativas, em muitos casos orientadas exclusivamente para minimizar tensões e conflitos. Certamente o que já não é possível é negar esta problemática.

É neste contexto que se situa este trabalho que pretende analisar as relações entre educação e interculturalidade hoje na América Latina, o papel da educação escolar nesta perspectiva e os desafios que teremos de enfrentar para promover processos educativos verdadeiramente informados pela perspectiva intercultural.

Origens da perspectiva intercultural em educação

A reflexão sobre o papel da educação em uma sociedade cada vez mais de caráter multicultural, é recente e crescente no nível internacional e, de modo particular, na América Latina. No entanto, a gênese desta preocupação obedece a origens e motivações diferentes em diversos contextos, como o europeu, o norte-americano e o latino-americano.

Segundo Jordán (96), esta perspectiva surge não somente por razões pedagógicas, mas principalmente por motivos sociais, políticos, ideológicos e culturais . A origem desta corrente pedagógica pode ser situada aproximadamente há trinta anos, nos Estados Unidos, a partir dos movimentos de pressão e reivindicação de algumas minorias étnico-culturais, principalmente negras.

"Estes protestos antidiscriminatórios encontraram logo eco em outros países ocidentais: por exemplo, grupos asiáticos na Inglaterra, índios no Canadá, aborígenes na Austrália, indonésios na Holanda, etc. Ao mesmo tempo que foram implantados os direitos civis reivindicados, começaram a proliferar por parte dos grupos como os mencionados, as correlativas demandas sociais, culturais e educativas. Se é verdade que os diferentes grupos étnico-culturais se mostraram ativos durante estes anos em pressionar os poderes públicos a favor de uma recuperação de sua identidade cultural e, inclusive, de uma consideração escolar de suas diferentes línguas e culturas, não é menos real o hiato todavia existente entre os ideais democráticos pluralistas proclamados pela maioria dominante e as práticas mais ou menos discriminadoras que os grupos minoritários continuam freqüentemente experimentando em nossos dias". (Jordán,96, p.11-12).

Portanto, é possível afirmar que a perspectiva intercultural em educação não pode ser dissociada da problemática social e política presente em cada contexto. Relações culturais e étnicas estão permeadas por relações de poder. Daí seu caráter muitas vezes contestador, conflitivo e mesmo socialmente explosivo.

No caso europeu, a preocupação por trabalhar os processos educativos nesta perspectiva nasce do fenômeno da imigração, da presença na Europa ocidental, cada vez mais numerosa nas últimas décadas, de pessoas provenientes dos mais variados continentes, da África, Ásia e América Latina, assim como, na última década, do Leste Europeu. Esta realidade cria novas situações, entre as quais a presença maciça de estrangeiros nas escolas públicas dos diferentes países provocando uma problemática complexa e, em muitos casos, conflitiva. A maior parte das políticas adotadas por estes países tendem a enfatizar a inserção destas populações no novo contexto , favorecendo a assimilação cultural, muitas vezes realizada tendo por base o fato de se ignorar e mesmo negar a cultura de origem destes grupos. Recentemente, também o reconhecimento das diferentes nacionalidades presentes no mesmo país tem favorecido o desenvolvimento desta preocupação no bojo dos esforços de promoção de uma educação intercultural, como é o caso da Espanha. O fato é que as experiências de educação multicultural, utilizando diferentes abordagens e metodologias, se vêm multiplicando no contexto europeu e norte-americano, assim como uma ampla produção acadêmica vem se desenvolvendo, acompanhada da promoção da pesquisa na área.

No entanto, no que diz respeito à América Latina, a preocupação intercultural, nasce a partir de outro horizonte. Para Zúñiga Castillo e Ansión Mallet (97), esta abordagem surge referida as nossas populações indígenas. Para estes autores, referindo-se ao Peru
"As primeiras demandas de exigências educativas que emanam da diversidade cultural de nosso país se deram nas primeiras décadas deste século, graças a José Carlos Mariátegui e Luis E. Valcarcel. Conjuntamente com as necessidades de ordem étnico e cultural, eles perceberam agudamente as necessidades sócio-econômicas das populações quéchuas e aimaras. Por esta razão, Mariátegui postula que o problema do índio no Peru é o problema da terra. Valcárcel, desde seu papel de educador, propõe o funcionamento de Núcleos Escolares Camponeses que oferecessem uma educação integral às crianças, que incluísse componentes de preparação para o trabalho, um de caráter agropecuário e outro técnico". (p.31)

A partir desta época são várias as experiências educativas realizadas em diferentes países latino- americanos, orientadas a atender de modo mais adequado a diferentes grupos sociais e culturais marginalizados. Neste sentido, especialmente a partir da década dos cinqüenta, os movimentos de educação popular contribuíram de modo muito significativo e enriquecedor para promover processos educativos a partir dos componentes culturais dos diversos grupos populares.

Partimos da hipótese de que a preocupação por uma educação que respeite a diversidade cultural emerge de modo original na América Latina e é muito anterior ao atual movimento de valorização desta perspectiva que se desenvolve no plano internacional. Valeria a pena investigar detalhadamente este processo, resgatar suas melhores experiências e aprofundar na sua análise para enriquecer as atuais reflexões e discussões nesta área.

No entanto, o desafio de promover uma educação intercultural não se restringe a determinadas populações específicas, como se somente a elas fosse exigido o esforço de reconhecimento e valorização das culturas diferentes da sua de origem. Hoje urge ampliar este enfoque e considerar a educação intercultural como um princípio orientador, teórica e praticamente, dos sistemas educacionais na sua globalidade.

A cultura escolar: um universo monocultural?

Rigoberta Menchú Tum, guatemalteca, indígena quiché, prêmio Nobel da Paz em 1992, militante dos direitos humanos, narra assim a opinião do seu pai sobre a função da escola:
"Infelizmente, se ponho você numa escola, vão ‘desclassar’ você, vão ‘ladinizar’ você e isso eu não quero e por esta razão não a ponho."

E, acrescenta a própria Rigoberta:
"Talvez o meu pai tivesse tido a oportunidade de me oferecer a possibilidade de uma escola aos quatorze anos, mas não podia, porque sabia as conseqüências e as idéias que me iam meter na escola" (In: Burgos, 83, p.216)

Estas palavras explicitam dramaticamente a questão das relações entre escola e cultura(s) e o papel homogeneizador da cultura escolar. Muitos grupos sociais e culturais vivem sentimentos, as vezes não explicitados, semelhantes aos expressados por Rigoberta e seu pai. O fracasso escolar, certamente seletivo, está aí para evidenciar quem são os que fracassam na escola. A desconexão entre a cultura escolar e a cultura social de referência dos alunos e alunas tem sido ultimamente denunciada por inúmeros autores e evidenciada por diversas pesquisas. As nossas salas de aula, onde pretensamente se ensina e se aprende, deveriam ser espaços de lidar com o conhecimento sistematizado, construir significados, reforçar, questionar e construir interesses sociais, formas de poder, de vivências que têm necessariamente uma dimensão antropológica, política e cultural.

No entanto, em geral, a cultura escolar apresenta um caráter monocultural. Para Gimeno Sacristán (95):
"A cultura dominante nas salas de aula é a que corresponde à visão de determinados grupos sociais: nos conteúdos escolares e nos textos aparecem poucas vezes a cultura popular, as subculturas dos jovens, as contribuições das mulheres à sociedade, as formas de vida rurais, e dos povos desfavorecidos (exceto os elementos de exotismo), o problema da fome, do desemprego ou dos maus tratos, o racismo e a xenofobia, as conseqüências do consumismo e muitos outros temas problemas que parecem “incômodos”. Consciente e inconscientemente se produz um primeiro velamento que afeta os conflitos sociais que nos rodeiam quotidianamente.(p.97).

A análise do cotidiano escolar de diferentes escolas tem evidenciado claramente a pertinência destas afirmações. A cultura escolar predominante nas nossas escolas se revela como "engessada", pouco permeável ao contexto em que se insere, aos universos culturais das crianças e jovens a que se dirige e a multiculturalidade das nossas sociedades.

Parece que o sistema público de ensino, nascido no contexto da modernidade, assentado no ideal de uma escola básica a que todos têm direito e que garanta o acesso a todos dos conhecimentos sistematizados de caráter considerado "universal", além de estar longe de garantir a democratização efetiva do direito à educação e ao conhecimento sistematizado, terminou por criar uma cultura escolar padronizada, ritualística, formal, pouco dinâmica, que enfatiza processos de mera transferência de conhecimentos, quando esta de fato acontece, e está referida à cultura de determinados atores sociais, brancos, de classe média , de extrato burguês e configurados pela cultura ocidental, considerada como universal.

A dinâmica cristalizada na cultura escolar apresenta uma enorme dificuldade de incorporar os avanços do desenvolvimento científico e tecnológico, as diferentes formas de aquisição de conhecimentos, as diversas linguagens e expressões culturais e as novas sensibilidades presentes de modo especial nas novas gerações e nos diferentes grupos culturais. Os processos de aquisição-construção-desconstrução-reconstrução do conhecimento, em profunda crise na sociedade atual, onde caminhos e linguagens diversificadas se impõem, aparecem no dia a dia das salas de aula de modo homogêneo e repetitivo, através de formas estereotipadas, na grande maioria das situações.

Chama atenção quando se convive com o cotidiano de diferentes escolas, como são homogêneos os rituais, os símbolos, a organização do espaço e dos tempos, as comemorações de datas cívicas, as festas, as expressões corporais, etc. Mudam as culturas sociais de referência mas a cultura da escola parece gozar de uma capacidade de se auto-construir independentemente e sem interagir com estes universos. É possível detectar um "congelamento" da cultura da escola que, na maioria dos casos, a torna "estranha" aos seus habitantes.
No entanto, como afirma Giroux (95) :

"Os/as educadores/as não poderão ignorar, no próximo século, as difíceis questões do multiculturalismo, da raça, da identidade, do poder, do conhecimento, da ética e do trabalho que, na verdade, as escolas já estão tendo de enfrentar. Essas questões exercem um papel importante na definição do significado e do propósito da escolarização, do que significa ensinar e da forma como os/as estudantes devem ser ensinados/as para viver em um mundo que será amplamente mais globalizado, high tech e racialmente diverso que em qualquer outra época da história"(p.88)

Da multiculturalidade à interculturalidade

Os termos multiculturalismo e interculturalismo são muitas vezes utilizados como sinônimos. No entanto, neste trabalho empregamos a palavra multiculturalismo para significar uma realidade social: a presença de diferentes grupos culturais numa mesma sociedade.

A toma de consciência desta realidade, em geral é motivada por fatos concretos que explicitam diferentes interesses, discriminações e preconceitos presentes no tecido social. Uma situação até então considerada "normal" e "natural", se revela como permeada por relações de poder, historicamente construídas e marcada por desigualdades e estereótipos raciais e culturais. Os "outros", os diferentes se revelam em toda a sua concretude. Para muitas pessoas e grupos sociais esta descoberta é altamente ameaçadora. Surgem então comportamentos e dinâmicas sociais que constróem muros. Física , afetiva e ideologicamente evita-se o contato e criam-se mundos próprios, sem relação com os "diferentes". Fenômenos desta natureza provocam na sociedade "apartheid’s" sociais e culturais, processos de guetificação que, nas grandes cidades latino-americanas, cada vez mais se acentuam. Portanto, a consciência do caráter multicultural de uma sociedade não leva espontânea e necessariamente ao desenvolvimento de uma dinâmica social informada pelo caráter intercultural.

O interculturalismo supõe a deliberada interrelação entre diferentes culturas. "O prefixo inter indica uma relação entre vários elementos diferentes: marca uma reciprocidade (interação, intercâmbio, ruptura do isolamento) e, ao mesmo tempo uma separação ou disjuntiva (interdição, interposição, diferença). Este prefixo não corresponde a um ‘mero indicador retórico, mas se refere a um processo dinâmico marcado pela reciprocidade de perspectivas’. Estas perspectivas são representações sociais construídas em interação (Ibidem). Para Micheline Rey (1986) o prefixo se refere à interação, mudança e solidariedade objetiva. Caracteriza uma vontade de mudança, de ação no contexto de uma sociedade multicultural".(Muñoz Sedano, 97, p.119)

Para Zuñiga Castillo e Ansión Mallet (97) , a interculturalidade pode converter-se num princípio normativo, no âmbito pessoal e dos processos sociais.

No nível individual supõe promover o diálogo no interior de cada pessoa entre as diversas influências culturais que a configuram e a que está exposta, às vezes em conflito ou não sempre fáceis de serem harmonizadas.

"Obviamente surgem problemas ao se tentar processar as múltiplas influências, mas, ao fazê-lo de modo mais consciente, talvez se facilite um processo que de toda maneira se inicia no interior da pessoa sem que ela tome plena consciência dele. Este diálogo consciente se pode dar de muitas formas e não se sabe bem como se produz. No entanto, se pode perceber visivelmente que pessoas submetidas a influências culturais diversas freqüentemente processam estas influencias de modos similares" (p.15)

Em geral, este processo emerge com maior frequência quando se muda de contexto habitual de vida ou, por alguma razão, se é obrigado a entrar em relação com grupos e culturas diferentes da nossa de origem.

Quanto ao nível social, a interculturalidade orienta processos que têm por base o reconhecimento do direito à diversidade e a luta contra todas as formas de discriminação e desigualdade social e tentam promover relações dialógicas e igualitárias entre pessoas e grupos que pertencem a universos culturais diferentes. Neste sentido, trata-se de um processo permanente, sempre inacabado, marcado por uma deliberada intenção de promover uma relação dialógica e democrática entre as culturas e os grupos involucrados e não unicamente de uma coexistência pacífica num mesmo território. Esta seria a condição fundamental para qualquer processo ser qualificado de intercultural.

Educação Intercultural: o que é e o que não é

Tendo presente as reflexões acima realizadas, podemos afirmar com Jordán (96) que a educação intercultural no âmbito escolar não pode ser reduzida:

- a um desejável horizonte democrático e a um ideal pedagógico com pouca incidência na prática cotidiana, limitado à introdução de um conjunto da atividades esporádicas sem integração com o currículo escolar, a uma série de apresentações de palestras, espetáculos musicais, comidas, danças, videos, etc, sobre diferentes culturas;

- a um conjunto de atividades ou mesmo a um currículo específico dirigido exclusivamente a determinados grupos sócio-culturais e/ou escolas onde há uma presença significativa de alunos/as "diferentes"; neste caso, facilmente terminaria por adotar a abordagem da educação compensatória, interpretando a diferença como déficit, particularmente na área acadêmica;

- a uma preocupação exclusiva de determinadas áreas curriculares , consideradas mais afins a este tipo de preocupação como as ciências sociais, filosofia, língua materna, atividades artísticas, etc;
Muitos têm sido os modelos educativos desenvolvidos na perspectiva da promoção de uma educação intercultural.

Em um "Taller Nacional" sobre "Educação Popular e Pedagogia da Diversidade", realizado em Cochabamba (Bolívia), de 12 a 15 de julho de 1996, partindo-se da afirmação de uma relação dinâmica entre contexto e cultura que foi assim expressada:

"Todas as culturas são dinâmicas e vão recreando-se e modificando-se de acordo com seus marcos de regeneração e/ou reprodução. Deste modo todas as culturas possuem processos internos que lhes permitem manter-se como diferentes e singulares, ao mesmo tempo que estabelecem relações e vínculos com outras culturas através de negociações que lhes permitem seguir vivendo no meio de outras ou da assimilação e acomodação de elementos destas culturas para sua vida própria. Esta dupla dimensão de relações internas e externas se dá em relação ao contexto e ao espaço em que se desenvolve cada cultura" (p.19),

Os participantes diferenciaram duas tendências a partir da análise de diferentes experiências educativas que se propõem trabalhar a diversidade a partir da perspectiva cultural. A primeira, "proposta única que se adapta à diferença", parte de uma proposta global, de caráter geral, que vai se adaptando na prática às diferenças. Quanto á segunda, "proposta a partir da diferença", inverte este movimento e tem como ponto de partida o reconhecimento da diferença como base para qualquer trabalho educativo. "Não se trata de adaptar uma visão e ação únicas e sim de desenvolver ações diferentes em cada contexto cultural diferente" (p.21).

Esta tensão dialética entre o comum e o diferente é inerente à perspectiva da educação intercultural e é possível distinguir e agrupar as diferentes propostas a partir de como se situam e trabalham esta tensão.
Para Bartolomé Pina (97), o critério fundamental que identifica as diferentes tendências é sua finalidade última, o que se pretende potenciar através da ação educativa. Surgem então, a partir da análise de programas concretos, cinco grandes opções: manter a cultura hegemônica de uma sociedade determinada, reconhecer a existência de uma sociedade multicultural, fomentar a solidariedade e reciprocidade entre culturas, denunciar a injustiça provocada pela assimetria cultural e lutar contra ela e avançar em direção a um projeto educativo global que inclua a opção intercultural e a luta contra todas as formas de discriminação. Somente os modelos orientados pelas três últimas finalidades assinaladas poderiam, segundo esta autora, ser considerados como adotando de alguma forma ou em algum grau, mesmo com caráter limitado, uma perspectiva intercultural.
Quais seriam, então, os critérios básicos para se promover processos educativos em uma perspectiva intercultural? Enumeramos a seguir alguns que consideramos fundamentais:

- o ponto de partida deve ser uma perspectiva em que a educação é vista como uma prática social em íntima relação com as diferentes dinâmicas presentes numa sociedade concreta:
"A pedagogia intercultural é tanto escolar como social. A sociedade e a escola têm de unir suas ações no processo de educação intercultural. Consequentemente, não seria arriscado afirmar que a pedagogia intercultural tem um 50 por 100 de pedagogia escolar e outro 50 por 100 de pedagogia social". (Merino y Muñoz, 95, p.133)

- é importante articular a nível das políticas educativas, assim como das práticas pedagógicas, o reconhecimento e valorização da diversidade cultural com as questões relativas á igualdade e ao direito à educação como direito de todos/as. Estas duas exigências mutuamente se reclamam e não podem ser vistas como contrapostas. A atenção às diferentes identidades é inerente a construção da igualdade e da democracia;

- a educação intercultural não pode ser reduzida a algumas situações e/ou atividades realizadas em momentos específicos ou por determinadas áreas curriculares, nem focalizr sua atenção exclusivamente em determinados grupos sociais. Trata-se de um enfoque global que deve afetar a cultura escolar e a cultura da escola como um todo, a todos os atores e a todas as dimensões do processo educativo, assim como a cada uma das escolas e ao sistema de ensino como um todo;

- esta perspectiva questiona o etnocentrismo que, explícita ou implicitamente está presente na escola e nas políticas educativas e coloca uma questão radical: que critérios utilizar para selecionar e justificar os conteúdos "no sentido amplo", que não pode ser reduzido aos aspectos cognitivos- da educação escolar?

- a educação intercultural afeta não somente aos diferentes aspectos do currículo explícito, objetivos, conteúdos propostos, métodos e estilos de ensino, materiais didáticos utilizados, etc, como também o currículo oculto e as relações entre os diferentes agentes do processo educativo professores/as, alunos/as, coordenadores/as, pais, agentes comunitários, etc. Neste sentido, trabalhar os ritos, símbolos, imagens, etc, presentes no dia a dia da escola e a auto-estima dos diferentes sujeitos e construir relações democrática que superem o autoritarismo e o machismo tão fortemente arraigados nas culturas latino-americanas, constituem desafios iniludíveis.

A perspectiva da educação intercultural apresenta uma grande complexidade e nos convida a repensar os diferentes aspectos e componentes da cultura escolar e da cultura da escola eo sistema de ensino como um todo. Não pode ser trivializada. Coloca questões radicais que têm que ver com o papel da escola hoje e no próximo milênio. Todos os educadores e educadoras estamos convidados a ressituar nossas teorias e nossas práticas a partir dos desafios que ela nos coloca.

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